sábado, 17 de maio de 2014

De livros, Facebooks e WhatsApps

Por Francisco Espiridião

No início dos anos 1990, este escriba era chefe de redação da Folha de Boa Vista. Naquele tempo, mestre Afonso Rodrigues já era um dos articulistas cativos da página de opinião, como o é até hoje. Naqueles dias, ele havia editado uma coletânea de suas melhores crônicas publicadas não só na Folha, mas também em outros jornais que por aqui passaram e que hoje são só saudades. Tribuna e A Gazeta, dois deles.

Numa de nossas conversas na redação mais de 20 anos atrás, Mestre Afonso me dizia que publicar aquele livro tinha sido o pior negócio em que se havia metido. Depois de tantas lutas, busca daqui e dali quem preparasse a capa, quem fizesse a revisão, quem diagramasse à sua maneira e gosto, definir a gráfica – que tem de ser das boas, que dão qualidade ao conteúdo –, juntou as economias e partiu para os ‘finalmentes’.

Conseguiu transformar os escritos num tomo que solenemente batizou de “O Caçador de Marimbondos”. Pagou a gráfica que, dias depois, entregou-lhe mil exemplares devidamente acondicionados em caixas e mais caixas de papelão. Se até aí tinha sido para ele uma odisseia, não imaginava o que ainda estava por vir.

Mestre Afonso queixava-se de que a produção encalhara. Onde armazenar tantas e tantas caixas de livros? O encalhe é natural. Tentar viver de vender livros hoje em nossa cidade é um tantinho assim de presunção. Imagina, então, 20 anos atrás.

A casa de Mestre Afonso transformara-se literalmente em um depósito literário. Eram livros debaixo da cama, por sobre as mesas, em cima do guarda-roupa, dentro do forno do fogão, na pia da cozinha e onde mais se pensasse.

Anos depois, experimentei a mesma sensação. Meu primeiro “rebento”, “Até quando? Estripulias de um Governo Equivocado”, foi tremendo fracasso. Mandei fazer tiragem de 500 exemplares. Da metade fiz cortesia a amigos, e, mesmo assim uma montanha deles teima ainda hoje em ocupar espaços na garagem de casa. Parece que o danado pariu feito as produções de Petra Cotes, de Marquez.

Com o último, “Histórias de Garimpo”, até que a decepção não foi tamanha. Consegui livrar os custos e fazer uma viagem com o que sobrou. Mas a verdade é que tentar viver da venda de livros é um negócio complicado, especialmente num momento em que a rapaziada está mais “ligada” nos Facebooks e WhatsApps da vida.

Ninguém tem mais tempo para perder com “cansativas leituras”. Vem daí a desilusão do professor de matemática da Universidade Federal de Roraima, Gentil Lopes da Silva, que decidiu chamar a atenção para esse momento de cegueira incinerando  parte de sua produção intelectual.

Na tarde de terça feira (13), Gentil fez uma fogueira com algumas dezenas de exemplares de livros didáticos produzidos por ele. Fruto suado de anos e anos de pesquisas em sua área de atuação, as chamadas ciências exatas.

O tiro de misericórdia em sua esperança de difusão do conhecimento produzido, disse, foi a negativa da Universidade de adquirir os exemplares, o que o professor considerou uma desfeita com o seu trabalho. Porém, num país em que um presidente da República jacta-se de nunca ter lido um livro na vida, o que esperar de seus patrícios?

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