sábado, 4 de outubro de 2014

De arte e traição

Por Francisco Espiridião 

“Que tempo mais vagabundo este agora, que escolheram pra gente viver”, já dizia Cazuza na década de 80 do século passado. Nunca na história deste Estado se viu tanta leniência com a malfeitoria. Tanta aquiescência com a traição desenfreada entre companheiros de partidos políticos. E fora deles.

Costumo dizer que sou roraimense. Não essa história de coração, por adoção ou outras balelas. Mas roraimense de verdade. De boa cepa, mesmo. Para confirmar essa afirmativa e para o deleite do meu massageado ego, no início do ano passado fui condecorado com o título de cidadão boa-vistense.

Título, aliás, concedido bondosamente pelos colegas jornalistas da Câmara de Vereadores, Francisco Paes e Eudiene Martins, que indicaram o meu nome ao vereador Manoel Neves, que topou a parada e conseguiu aprová-lo no chamado “parlamento mirim”. 

Às vezes, no entanto, sou traído pela memória quando me pego dizendo: “Ah, lá na minha terra...” Ocorre que quando isso vem à tona, é mais força de expressão que mesmo uma referência a determinado lugar. É mais um devaneio, do tipo retroagir no tempo. “Lá atrás...”. 

Uma dessas recaídas tem me ocorrido agora, nesse período pré-eleitoral. É impressionante o número de acordos quebrados, ditos por não ditos... É assim, “pero no mucho”... Coisa de deixar o estômago embrulhado. “Lá na minha terra”, ou seja, em tempos de outrora, não era assim.

Utopia? Até pode ser. Mas houve um tempo em que homens e mulheres honravam a palavra empenhada. Aliás, foi lá atrás, quando, ainda menino, que aprendi que se o homem não pode honrar a palavra empenhada muda de lado.  

Mas hoje os tempos são outros. Há uma corrente formada por libertários que odeiam a calça comprida e decidiram sair de saia pelas ruas. Em São Paulo. Nem por isso são considerados traidores. 

Em outros tempos, e não faz muito assim, aqui mesmo, às margens deste rio chamado Branco, costumava-se pagar o procedimento claudicante com preço de sangue. Hoje, não. Plagiando o Flávio Mendes, “É tudo uma maravilha!” Vivemos um mundo do vale tudo. Traições, mentiras, desamor, etc., etc. Tudo café pequeno, ninguém reclama de nada e toca a vida em frente.

A indústria da boataria jamais esteve tão ativa como nesta semana que antecede o pleito. Só na segunda-feira mataram o governador e candidato à reeleição, prenderam um candidato ao Senado, enquanto outro decidiu correr com a sela.

Matérias veiculadas nas redes sociais, “bombando”, como diz a rapaziada entrosada, no tal do WhatsApp. Até eu já entrei nessa “wave”. Tudo tão verdadeiro como uma nota de 3 reais. Cenas dignas de romancistas de quinta categoria.


Mas, voltando ao que interessa, depois de amanhã será o dia e a hora de a onça beber água. Domingo, dia maior do Estado, vamos todos, irmanados, com as colinhas na manga, apertar o dedão e decidir o que queremos para os próximos quatro anos. Afinal, a fome está em toda parte, mas a gente come, levando a vida na arte, já dizia Cazuza.

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