Viagem de matar qualquer um essa de Boa Vista até Porto
Velho. O tempo de espera no aeroporto de Manaus é de lascar. O pior é que tiraram
dos saguões aquelas antigas e confortáveis poltronas – lembram-se? – que permitiam
a gente tirar um cochilo. Foram substituídas por frias cadeiras metálicas de
pouco ou nenhum conforto.
Saí de Boa Vista por volta das 2h30 do domingo (20) e
cheguei ao destino às 11h. Sem pregar o olho. Depois de quase 12 horas de
sono reparador, já na segunda-feira (21), aluguei um carro e segui para Guajará
Mirim. A BR-364 está em ótimas condições de Porto Velho até a entrada para o Acre
(antes de chegar a Abunã). De lá, segue-se pela BR-425. Essa, ao contrário, é mais
buracos que asfalto. Mas isso era o de menos.
A expectativa superava as crateras e obstáculos do caminho.
Voltar a sentir cheiros há muito esquecidos, rever gentes e locais perdidos no tempo, marcas indeléveis de minha
infância, compensava qualquer transtorno.
Tudo começou pela constatação concreta, cerca de 100
quilômetros mais tarde, de fragmentos de um todo que ensejavam pensamentos oníricos:
pouquíssimas intercessões dos trilhos da antiga EFMM, a velha e extinta Estrada
de Ferro Madeira Mamoré, a conhecida “Ferrovia da Morte”, com o tapete escuro do
asfalto que conduz o desenvolvimento de um estado pujante. (A foto mostra os galpões mais importantes da EFMM, em Porto Velho,
totalmente conservados, juntamente com alguns vagões. Pura manutenção da
memória.)
Cerca de 50 quilômetros antes do distrito de Jaci Paraná acha-se plantado, à margem da BR-364, o complexo
prisional de segurança máxima, sob a responsabilidade do governo federal.
Para desconsolo e tristeza dos rondonienses, nele está
hospedado nada menos que o megatraficante Luiz Fernando da Costa, o temido Fernandinho
Beira-Mar, cuja transferência do Rio de Janeiro para Rondônia sangrou pouco
mais de 1 milhão de reais dos cofres públicos.
Jaci Paraná marca o meio da viagem entre Porto Velho e
Abunã, divisa com o estado do Acre. Antes, quando ainda menino, a gente levava longas sete
horas para chegar. O trajeto era feito nas marias-fumaça de tantas saudades.
Agora, estrada asfaltada, gasta-se menos de duas horas.
A novidade não se restringe apenas à rapidez com que hoje se
cobre o percurso. Jaci Paraná, naquela época, final dos anos 60 do século
passado, era um lugarejo inexpressivo, que tinha como único atrativo a ponte de
ferro bruto da antiga estrada – pouco mais de 150 metros de extensão –, armada sobre o
rio Jaci pelos ingleses, no início do século passado.
A velha ponte encontra-se totalmente abandonada, corroída pelo tempo e pela ferrugem e tomada pelo mato em suas cabeceiras. Sequer fora aproveitada pela
tecnologia como leito da BR, a exemplo de outros pontos de intercessão. Mesmo
assim, segue de pé, bem juntinho da estrada, olhando os caminhões, carretões
bitrens ou pequenos automóveis que passam sem lhe dar a menor bola. Verdadeira testemunha de um tempo que não volta mais.
Hoje, o distrito de Jaci Paraná bem que poderia ser uma das mais importantes
cidades do estado de Rondônia. Tem potencial para isso. Falta-lhe unicamente o aval
político. Abriga uma população estimada em 30 mil habitantes.
O distrito tem como fonte de renda, a pujante indústria
leiteira – confirmando o atual slogan do estado, a “Terra da Pecuária”. Antes,
Rondônia era conhecido como a terra do minério de estanho. Além da pecuária, a
agricultura e, principalmente, os empregos oferecidos pela construção da Usina
Hidrelétrica de Jirau, sob a responsabilidade da construtora Camargo Correia,
dão o tom do “desarrollo”.
NOVOS TEMPOS
Valdeci Antônio dos Santos, casado, 42, seis filhos, todos
rondonienses, é o dono do restaurante e panificadora localizados na entrada da
cidade. Como muita gente que faz o dia a dia do estado de Rondônia de ponta a
ponta, Valdeci também não é filho da terra. Capixaba de nascimento, inicialmente ele decidiu
se estabelecer em Guajará-Mirim, minha terra natal.
Deixou tudo o que tinha naquela que é a “Pérola do Mamoré”, fronteira
molhada com a Bolívia, onde morava havia mais de 25 anos, e veio para Jaci
Paraná em busca de ganhar dinheiro. “Está dando certo”, diz. Um quilo de pão
francês custa a bagatela de 13 reais.
O comerciante se lembra que Jaci Paraná, em 1985, tinha no máximo 100
habitantes. Esse marasmo tomou conta da região até cerca de cinco, seis anos atrás, quando ali se instalaram os canteiros da obra da hidrelétrica.
“A partir de 2006 começaram a chegar os moradores que hoje
tornam o local uma cidade aprazível de se morar”, declara Valdeci, ressaltando
o desenvolvimento econômico e social que a localidade tem experimentado nos últimos
anos.
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