sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

Uma trama excepcional

Por Francisco Espiridião

Revendo crônicas que escrevi e publiquei em www.franciscospid.blogspot.com.br, encontrei esta que considero instigante e que, na minha visão, vale a pena ser reeditada. Foi publicada no dia 6 de maio deste ano. Acho que pode levar alguém a querer também viver a mesma experiência literária. Segue na íntegra.

Acabo de ler o segundo romance de Henri-Marie Beyle (1783-1842), o francês que adotou Sthendal por pseudônimo. O primeiro, O vermelho e o negro, li dois anos atrás, por recomendação da chefa, Albani Mendonça. A Cartuxa de Parma (Editora Globo, 560 páginas) é tão cativante quanto o primeiro. Uma história apaixonante.

Nos dois romances, uma conexão entre os protagonistas. Julien Sorel, de O vermelho e o negro, aceita a função eclesiástica por imposição. Já em Cartuxa, o protagonista Fabrício Del Longo, depois de se envolver em tantos apuros, luta por se tonar arcebispo. Chegou lá. Por força de sua carência amorosa, torna-se um eloquente pregador católico.

Stendhal escreve essa segunda obra – o terceiro romance, Lucien Leuwen, ficou inacabado, sendo publicado, assim mesmo, postumamente, em 1894 – tendo como ponto de partida um estudo sobre famílias antigas da Itália, entre elas a Farnese. A trama tem lugar na Itália durante e logo após o Império Napoleônico francês.

A vida de Fabrício Del Longo, a contragosto de seu pai, um monarquista italiano de família nobre, mostra-se desapegada de quaisquer arroubos de vaidade. Juvenil e tresloucado, italiano de nascimento, o personagem só pensa em conhecer e lutar ao lado de Napoleão, a quem venera. Consegue seu intento, em meio à batalha de Waterloo.

Depois disso, vários embaraços marcam a vida de devaneios de Del Longo, até tropeçar num certo mambembe, a quem elimina a facadas para liberar o trânsito a uma sugestiva “rapariga” que nem vale a pena. Essa história termina com o nosso herói batendo os costados na prisão – a cidadela –, onde fica sob os auspícios de um determinado general.

Em meio ao turbilhão, na antessala da masmorra, ele se vê fisgado pelo verdadeiro amor. Esse sentimento arrebatador – que jamais sentira por uma mulher, já que todas que passaram por sua vida, e foram muitas, significaram apenas divertimento passageiro –, tem como endereço a filha do detentor das chaves do cárcere, o general Fábio Conti.

O importante em toda a trama é que ela mostra os enredos políticos do momento. Coisas do coração se misturam com decisões administrativas do império. Oposição e situação se digladiam a ponto de descambar em assassinatos, tentativas de envenenamento e até um prenúncio de incesto entre a tia, Gina Pietranera, a duquesa Sanseverina, e o protagonista. 

É bastante sugestiva a ideia de o título da obra não se justificar senão na última página da narrativa. Isso, porque, diante de desilusão amorosa, Del Longo recolhe-se ao convento, a Cartuxa de Parma, para morrer. Morrer de amor, literalmente.

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