Francisco Espiridião
Dia desses, li matéria jornalística em que a ministra Cármen
Lúcia, do Supremo Tribunal Federal, dizia que há no País “uma intolerância
enorme para tudo o que seja diferente” e que “não adianta querer ser livre e
abrir mão de pensar”. Ou seja, dizer que é livre e não pensar, para ela, é uma
estrondosa (estrondosa aqui é por minha conta e risco) controvérsia.
Logo abaixo da matéria, fazendo parte da lista de
comentários, leio o de Elionard Teixeira Jales Jales, que se identifica como “Diretor
executivo na empresa Consulte & Conte Contabilidade Ltda”. Dizia
textualmente:
“As normas estabelecidas devem ser respeitadas. Educação é
também isto. O que existe é um Parlamento ruim, desqualificado e um Executivo
nojento, manipulador, com visão autoritária e monopolista. Faltam qualidades e
qualificação em nossos representantes.”
Daí, comecei a pensar. Afinal, pensar, ainda que numa
funhanhenta ditadura, é exercício perfeitamente possível, desde que o objeto
pensado permaneça no mais recôndito do pensador. Não é obrigatório externar. Millor
Fernandes já dizia que “livre pensar é só pensar”.
Mas, como eu dizia, comecei a pensar nas palavras escritas pelo comentarista da matéria intitulada “Ministra denuncia ‘intolerância’ no debate sobre liberdade”, divulgada no online do jornal Estado de São Paulo (29abr2014).
“O que existe é um parlamento ruim, desqualificado.” Concordo
plenamente. Muita coisa que tem saído das entranhas do Poder Legislativo é
mesmo monstruosidade a la Leviatã. Capaz
de aterrorizar.
“Um Executivo nojento, manipulador, com visão autoritária e
monopolista”. Sem querer generalizar, reduzo a “muitos casos” aqueles em que esses
adjetivos soam como elogio, dado o nível de perversidade instalada nos intestinos
de algumas instituições.
“Faltam qualidades e qualificação em nossos representantes”.
Concordo ipsis litteris com mais estas
premissas. Não se concebe que hoje, em plena era da informática, fique-se de três
a quatro horas, com uma senha nas mãos, esperando para ser atendido em qualquer
órgão público.
O ilustre membro da Consulte & Conte Contabilidade Ltda
tem razão ao expor a “problemática”. Mas esqueceu-se de pequeno detalhe: não
estabeleceu a “solucionática”, como diria Nenem Prancha, roupeiro, massagista,
olheiro e técnico do futebol brasileiro. “O Filósofo do Futebol”.
Elionard Teixeira Jales Jales esqueceu-se de pôr no grande
caldeirão dos desvarios sua excelência o povo brasileiro. Se o Parlamento é “ruim
e desclassificado”, quem, afinal, o criou senão o povo brasileiro, escolhendo a
dedo, um a um, os seus membros via voto direto?
Se o Executivo é “nojento, manipulador, com visão
autoritária e monopolista”, quem foi que criou a cobra para lhe picar senão o
próprio povo brasileiro? Volta-se aqui para três questões fundamentais:
educação, educação e educação.
Enquanto a educação estiver relegada a um segundo plano, o
povo brasileiro continuará, como disse a ministra Cármen Lúcia, querendo ser
livre, sem, contudo, primar pelo livre pensar, o que, no frigir dos ovos, é
tremenda contradição.
Enquanto a cultura de diminuir o professor em sala de aula,
tirando-lhe a autoridade diante dos “queridinhos do papai e da mamãe”, verdadeiras
feras indomadas, o Brasil continuará patinando em terreno enlameado. Com
direito só de olhar o Primeiro Mundo de longe, como quem quer pegar a estrela
com as mãos.
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