segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Voto secreto

Por Sebastião Nery

O coronel Chico Heráclio foi um Padre Cícero sem batina. E deixou histórias que Pernambuco e o Nordeste inteiro sabem e repetem. Em Limoeiro, quem mandava era ele. Era o senhor da terra, do fogo e do ar. Ou obedecia ou sumia. Fazia eleição como um pastor. Punha o rebanho na frente de casa, e ia tangendo, um a um, para o curral eleitoral.



Na mão, o envelope cheinho de chapas. Que ninguém abria, ninguém via, ninguém sabia. Intocado e sagrado como uma hóstia. Depois, o rebanho voltava, um a um, para comer. Mesa grande e fartura fartísssima. Era o primeiro preço do voto. E a festa da vitória. Um dia, um eleitor foi mais afoito:

- Coronel, já cumpri meu dever, já fiz o que o senhor mandou. Levei as chapas, pus os votos lá dentro, direitinho. Só queria perguntar uma coisa ao senhor : – Em quem foi que eu votei?

- Você está louco, meu filho? Nunca mais me pergunte uma asneira dessas. O voto é secreto.

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MURICI

José Murici, cearense boa praça, era fiscal federal do Instituto do Sal em Alagoas e adorava Maceió. Fez a campanha do candidato a governador que perdeu. O governador que ganhou pediu sua remoção para o Ceará.

José Murici ficou desesperado. No dia da viagem, os olhos cheios de lágrimas, encontrou no aeroporto o secretário do governador que tinha pedido, conseguido e providenciado sua saída. Avançou em cima dele como uma fera.

De serviço no aeroporto estava Bezerrão, investigador, dois metros de altura, 150 quilos de peso, analfabeto e sábio. Agarrou José Murici pelas costas, levou-o para um canto do aeroporto e lhe disse bem baixinho:

– Murici, Murici. Eu sou mais velho do que tu. Não sei ler mas conheço a vida. Volta para o teu Ceará que um dia o mandato do governador acaba, ele vai embora e tu vem de novo para Maceió. Murici, se tudo que subisse não caísse, o céu estava cheinho de talisca de foguete.

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