Por Isaltino Gomes Coelho Filho
Segundo Morris West, ao se iniciar o processo de canonização de um santo, há um personagem chamado O advogado do diabo (título
de um de seus livros) incumbido de levantar todos os defeitos e
aspectos negativos do candidato à santidade, para evitar que se
santifique alguém indevidamente. Numa cultura de “babação de ovo”, em
que todo mundo quer ser simpático e ninguém quer ser politicamente
incorreto, eu assumo esse papel, no tocante à vinda do Papa Francisco.
Sem receio: jogo de cena e que não terá desdobramentos práticos. A
Igreja Católica não se reerguerá no Brasil pelo fato de ele ter vindo.
Não se reerguerá em lugar algum do mundo por causa dele.
Quererão comer meu
fígado. Até os evangélicos mais preocupados com “o olhar do outro” (seja
lá o que isso seja) que com o olhar das Escrituras. Faz-nos falta um
Reis Pereira, que com olhar seguro, visão bíblica, discernia esses
eventos e os expunha em editoriais brilhantes de O jornal batista!
Ele tinha sólida bagagem histórica, visão teológica e base bíblica.
Interpretava os fatos e evitava o “oba oba” tão comum entre nós. Não
tenho um décimo de sua capacidade cultural, de seu brilho literário e de
sua sobriedade, mas, como ele, não tenho medo. Foi jogo de cena. Que
não soerguerá a Igreja. Como não a soergueu o Papa João Paulo I (“O papa
que ri” e que morreu pouco mais de um mês após sua eleição). Nem o Papa
que foi alvo de tiros, perdoou o agressor e beijava o solo aonde
chegava. Um poço de simpatia, sucedido depois por um Papa teólogo,
pensador sisudo, que em novo lance, mudou o viés, da simpatia para a
lógica teológica. Renunciou porque a Igreja não mudou, nem com riso, nem
com simpatia nem com teologia. Messias humanos não salvam. Plus ça change, plus c’est la même chose…
“O papa que veio do fim do mundo”, “o papa simples”, o
“papa sul americano” (esse culto ao sul americanismo ou latino
americanismo não me ilude), “o papa de olhar magnético”, e mais uma
série de adjetivos. Slogans publicitários. O homem está no posto há
menos de um ano. Não realizou nada, não marcou época, não efetuou
mudança alguma (a não ser cosmética) e é dado como o homem da grande
virada da Igreja. Uma multidão foi vê-lo, o aclamou, e a mídia loou seu
charme. Multidão é inconstante. Entre “Hosana ao Filho de Davi” e
Crucifica-o!”, não se passou uma semana! Mídia? Leiam (leiam mesmo!) os
editoriais do Correio da manhã, O diário de notícias, O jornal do
Brasil, O Globo, a revista O Cruzeiro da época. Quantos elogios à
revolução de 64! Leiam os exemplares de dois anos depois e verão as
críticas à ditadura de 64.
Fui católico. Minha mãe, Nelya Werdan, cedo enfermou
gravemente. Dos meus 7 aos meus 14 anos, ia dormir esperando que ela
morresse à noite. Lembro-me de um momento em que ela parecia ter
morrido. Eu tinha 7 anos e enquanto todos gritavam pela casa, eu chorava
nos fundos sozinho. Um garoto magrelo, chorando nos fundos da casa, na
Rua Barata de Almeida, 81, Engenho da Rainha. Ela voltou a si. Sua morte
sucedeu aos meus 14 anos. Em sua busca de cura, foi levada para o
espiritismo por D. Irene, que tinha um Centro, na Estrada Velha da
Pavuna. Mais tarde foi para um Centro em Padre Miguel, na rua Cerejeira,
24. Neste Centro, dia 23.02.1963 fez-se uma reunião por um ano de sua
morte. Eu fora batizado treze dias antes. Era menino. Entrei no Centro,
levado por meu pai e minha avó, Maria Werdan. A “entidade” não
incorporava no “aparelho”. Um incrédulo quebrava a corrente: o menino
batizado. Pediram-me que saísse. A “entidade” incorporou. Voltei. A
“entidade” foi embora. Expulsaram-me. Fui jogar bola na frente do
Centro, e até rasguei a calça. Mas D. Nelya, mesmo iludida pelo
espiritismo, me ensinou as orações católicas. Eu era o único dos Gomes
Coelho-Werdan, da família, que ia à missa. Ainda sei de cor o Pai nosso,
a Ave Maria, a Confissão de pecados, a Oração ao anjo da guarda, Oração
pela manhã e a Oração da noite. Após sua morte, ia semanalmente à sua
sepultura, no Cemitério de Irajá, sepultura 8968, e rezava por sua alma.
Rezava por sua alma todas as manhãs e todas as noites. Eu pensei em ser
padre. Guardo livros católicos desde os 10 anos! Eu era o único
católico praticante da família! Deixei de sê-lo ao conhecer o evangelho
na Igreja Batista de Acari, com 14 anos. Conheci Jesus Cristo. Minha
angústia espiritual foi saciada. Sou batista há 50 anos. Minha mãe
adubou-me o interesse por Deus. Eu quis Deus, desde criança, e ela
entendeu isso. Mas me mostrou o caminho equivocado. A graça de Deus me
trouxe ao caminho certo.
Mostrado meu débito com o catolicismo, na infância,
vamos aos fatos. A questão não é algo que o Papa disse. Foi o que não
disse. Ele ter dito que quer que a Igreja vá para a rua, que diferença
faz! Os militares foram para as ruas em 1964. Os caras pintadas foram
para a rua e Collor está aí. A UNE ia para as ruas e hoje é chapa
branca! Que diferença faz ir para as ruas? Dizer o quê? Fazer o quê? Ele
disse que não é ninguém para julgar os gays. Semanas antes disse haver
um lobby gay muito forte no seio da Igreja. A Gaystapo e simpatizantes
se abespinharão. Não estou emitindo juízo de valor! Conseguem ser
objetivos?
O Papa não
falou o que o líder da maior denominação crista do mundo deveria ter
dito. Que só Jesus Cristo salva. Que o evangelho é o poder de Deus para
salvação de todo aquele que crê. Na revista “Veja” ele aparece beijando
uma estatueta de Aparecida. Chocante! Um artefato menor que seus braços!
Não o vi segurando um Novo Testamento! Lembrei-me da queixa de Deus,
por Oséias, de homens beijando ídolos, ao invés de reverenciarem a
Palavra de Deus (Os 13.2). O Papa falou de Maria, mas não falou de
Jesus. Citou-o, mas não falou dele. Não falou do único “mandamento” de
Maria: “Fazei tudo o que ele vos disser!” (Jo 2.5).
O Papa é simpático. E dispõe de um grande aparato
midiático. É matéria que vende jornais e revistas. Mas não falou o que
devia: que só Jesus Cristo salva.
Os evangélicos me chocam pelo seu acriticismo. Raia à
alienação. Encantam-se com movimentos neopentecostais. Que passarão
porque cometem o mesmo erro da Igreja Católica: não falam de Jesus. A
Igreja, com Maria. Os neopentecostais, com o Espírito Santo. Confundem o
Ruah com sua psychê, o Espírito com seus insights.
Com seu poder midiático e seus recursos financeiros encantam
evangélicos incautos, mas não falam do poder da mensagem da cruz. Não
pregam o Crucificado. Todo movimento que não esteja alicerçado sobre
Jesus ruirá (Mt 7.24-26).
Falei num retiro de pastores certa vez. Antecedeu-me
um preletor que mostrou como o mundo será muçulmano. Eles têm mais
filhos que os cristãos e assim geram mais adeptos que nós (como se o
leito conjugal, e não o mundo, fosse o maior campo missionário da
igreja!), eles aplicam mais dinheiro na obra, eles fazem mais adeptos
que nós, compram jornais, levantam mesquitas, etc. Com um monte de
gráficos, deprimiu todo mundo. Sucedi-o e comecei com estas palavras: “O
reino deste mundo passou a ser de nosso Senhor e de seu Cristo!” (Ap
11.15). O futuro é do evangelho, é de Jesus. A história seguirá. O que
for de Jesus permanecerá de pé. O que não for ruirá. O nome não é Maomé.
Não é Maria. Não é Francisco. Não é Isaltino. O NOME é Jesus.
Podem desancar-me. Mas pensem (não é pecado): o Papa
voltará dentro de 4 anos. Meçam, então, o quanto a Igreja Católica terá
crescido. Meçam quanto as igrejas evangélicas terão crescido. Naquela
multidão na Praia, foto que encantou a tantos, havia milhares de
pessoas, como o menino Isaltino, de dez, doze anos, que queria algo para
seu coração, e descobriu, mercê do Espírito de Deus, que suas
necessidades espirituais e emocionais se encontravam no evangelho de
Jesus. Abracei-o há 50 anos. Sou pastor há 42 anos. Agora, no poente, me
aflijo, me frustro, até choro, por que não tenho mais 42 anos para
servi-lo. Vita brevis.
No tempo de Jeremias havia profetas que diziam o que o
povo queria ouvir. Eram o eco dos corações humanos. Os pecadores
continuam tentando ditar a agenda para Deus: “A Igreja tem que ser mais
humana, tem que se aproximar mais do povo!”. Querem que ela abençoe o
povo em seus pecados. A ótica certa é outra: “A igreja não pode perder
seu caráter de origem divina. Ela é a única instituição em toda a terra
que pode reivindicar isto. E o povo tem que se aproximar de Deus!”. O
referencial não é o povo. É a igreja ou ela não tem valor. A igreja não é
uma ONG religiosa para prestar os serviços que o povo deseja. Ela é o
Corpo de Cristo, incumbida de chamar os homens a acertarem suas vidas
com Deus! Ela não deve almejar vencer um concurso de popularidade, mas
pregar o que o Batista pregou, o que Jesus pregou, o que a Igreja de
Jerusalém pregou: reconciliem-se com Deus! Mudem de vida!
Todos gostaram quando o Papa disse: “Não tenho ouro
nem prata, mas o que tenho isto te dou”. Ouro e prata a Igreja tem. E
muito. Mas ele não completou a frase: “Em nome de Jesus Cristo, o
Nazareno!”. Jesus foi o grande ausente, e o seu evangelho foi o grande
ignorado.
Sem Jesus não há fé real. Sem Jesus não há futuro. Uma volta à cruz, Papa Francisco.
(Recebido por e-mail)
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