domingo, 22 de junho de 2014

Criando monstros

Por francisco Espiridião

Este assunto era para ter sido abordado na semana passada, quando a presidente Dilma Rousseff sancionou a chamada Lei da Palmada, que proíbe os pais de disciplinarem os filhos da forma como lhes convêm, ainda que com castigos físicos moderados, como sempre foi, principalmente na minha infância. Mas não deu.

Meus assessores decidiram por unanimidade que o assunto Convenção 169 da OIT era mais urgente. E assim foi. Mas, como quem manda nesta bargaça sou eu, decidi, então, abordá-lo hoje, ainda que tardiamente. Mas, atenção! Por estar com uma semana de atraso, o assunto não deixa de ser pertinente.

Então, vamos lá. A Lei da Palmada, também conhecida como Lei Bernardo, é um ato totalmente desnecessário. Ocuparam o Congresso, que tanto tem para fazer, com algo inócuo. Perderam tempo com mais uma lei que tem tudo para não pegar. Não porque o povo brasileiro seja insurrecto, mas pela situação e contexto social em que ela surge. A pergunta é: “Para quê?”

Se é para proibir os vexames a que foi submetido o menino Bernardo Uglione Boldrini, lá em Três Passos, Rio Grande do Sul, morto pela madrasta e, sabe-se lá, com a aquiescência do próprio pai, aí carece de honestidade. Sim, porque para se proibir abusos dessa natureza, o que mais existem neste país  são leis, decretos e até o Estatuto da Criança e do Adolescentes, o tal do ECA, sem qualquer conotação de nojo.

Se é para mostrar serviço, falhou de novo. Existem tantas outras áreas em que o Estado precisava estar atento. A saúde, por exemplo, onde as pessoas não deveriam morrer na porta dos hospitais por falta de quem lhes atenda, como ocorreu... bem, deixa para lá. Basta dar uma navegada rápida no bendito Google que se descobrem centenas de casos Brasil afora. Só nos últimos dois anos.

Mas o que diz mesmo essa tal Lei Bernardo? Nada além do que já se sabe. Ela proíbe que os pais batam na criança ou adolescente até levá-los à morte. Isso é novidade? Se fosse só isso, no entanto, ninguém nem estaria dando bolas para ela. Porque o Código Penal é mais do que suficiente para reger a matéria.

Porém... Ah, tem um porém, sim. Aliás, a esse porém poderíamos chamar de busílis, calcanhar de Aquiles. Trata-se da radicalidade que a Lei encerra. Se, contrariando a Bíblia Sagrada, o ECA proíbe que os pais orientem os filhos quanto à necessidade de se tornarem pessoas trabalhadoras e honestas quando crescerem, porque é de pequeno que se torce o pepino, a Lei Bernardo nada mais é que o Estado arrombando a porta da nossa casa. O Estado paternalista. Ditando normas de como devemos criar nossos filhos.

A escritora Lya Luft, em Veja desta semana, aborda a questão do respeito e autoridade. Coisas, aliás, que muita gente já não tem a menor ideia do que sejam. Ela diz, em sua crônica:

– Nem sempre é possível tratar com uma criança enfurecida ou um adolescente confuso, e uma dose amorosa de rigor pode pôr as coisas de novo em ordem, aliviando a situação.

Dona Lya Luft, ainda bem que a senhora já não tem mais filhos pequenos nem adolescentes. Senão, a senhora estaria incorrendo na quebra da Lei Bernardo. Um dos preceitos da tal lei diz que “o adolescente e a criança têm direito de serem educados e cuidados sem o uso de castigos físicos ou de tratamento cruel.” Castigos físicos, todos sabemos o que é. Mas ‘tratamento cruel’, a lei explica: “É a conduta que humilhe, ameace ou ridicularize a criança ou o adolescente.”

– Vai tomar banho, menino, você está parecendo um sujismundo! – tratamento cruel. Aí está inserido dois componentes da Lei: a humilhação e ridicularização da criança.

– Opa, chega de televisão. Já são 11h (23h). Vá escovar os dentes e cair na cama, já! – uso autoritário. Isso é considerado uma ameaça. Não pode.

Enfim, a partir do ECA, em consonância com a Lei Bernardo, estaremos criando feras. Em outras palavras, nossas crianças vão crescer pós-graduadas em dar trabalho à Polícia.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

Lula deveria é ser grato a FHC, que o livrou de uma ação de impeachment

Por Reinaldo Azevedo

Lula soltou os cachorros ontem, no evento petista que oficializou a candidatura de Alexandre Padilha ao governo de São Paulo. Acusou a oposição de fazer a campanha do ódio e dirigiu um ataque específico a FHC, seu antecessor. Na convenção do PSDB, no dia anterior, o ex-presidente tucano havia falado que queria os corruptos longe da política.

Muito bem! Neste domingo, Lula acusou FHC de ter comprado votos que garantiram a reeleição. Não contente, afirmou que o tucano não aprendeu a ter sentimentos na universidade. Ai, ai… Lula acha que só alguém com o seu próprio grau de ignorância — que nada tem a ver com burrice (inteligente ele é) — é capaz de ter coração.

Nesta segunda, FHC emitiu uma nota a respeito. Leiam. Volto em seguida.

“Lamento que o ex-presidente Lula tenha levado a campanha eleitoral para níveis tão baixos. Na convenção do PSDB, não acusei ninguém; disse que queria ver os corruptos longe de nós. Não era preciso vestir a carapuça. A acusação de compra de votos na emenda da reeleição não se sustenta: ninguém teve a coragem de levar essa falsidade à Justiça. Não é verdade que a oposição pretendesse derrubar o presidente Lula em 2005. Na ocasião, pedimos justiça para quem havia usado recursos públicos e privados na compra de apoios no Congresso, o que foi feito pelo Supremo Tribunal Federal. Apelo às lideranças responsáveis, do governo e da oposição, para que a campanha eleitoral se concentre na discussão dos problemas do povo e nos rumos do Brasil.”

Retomo

É a fala de uma pessoa sensata. Cumpre lembrar um fato que é de amplo conhecimento da imprensa e dos políticos. FHC cometeu, sim, a meu ver, um erro em 2005. Ele foi uma das lideranças que desaconselharam a oposição a pedir o impeachment de Lula, o que até os petistas julgaram que estava na iminência de acontecer. Cabeças coroadas do partido chegaram a debater a hipótese da renúncia. O momento mais dramático se deu quando Duda Mendonça confessou na CPI que o PT pagara por seus serviços com dinheiro do caixa dois. Pior: o depósito havia sido feito numa conta que ele mantinha no exterior.

E quem foi que desaconselhou a oposição a seguir na trilha do impeachment? Justamente FHC! Acreditava — e, até hoje, muitos críticos do PT acham que ele estava certo; não é o meu caso — que a deposição de um presidente que havia sido operário um dia e que ainda contava com apoio considerável na sociedade seria ruim para a democracia.

Assim, à diferença do que diz Lula, a oposição nunca tentou derrubá-lo, a não ser por intermédio das urnas. Ao contrário: quando condescendeu com a sua permanência no poder, acabou lhe dando a chance de o PT obter mais dois mandatos.

Lula deveria ser grato a seu antecessor. Mas quê… Até hoje não perdoa o fato de que o outro o venceu duas vezes nas urnas — e no primeiro turno. De resto, é preciso deixar claro: a disputa em 2014, no que diz respeito aos dois partidos, é entre Dilma e Aécio, não entre Lula e FHC.


sábado, 14 de junho de 2014

O Brasil e a Convenção 169, da OIT

 Sei que este não é o momento para abordar o assunto. Mas sou teimoso. Gosto de ser do contra. “Pero no mucho”. Enquanto todos falam, respiram, viajam nas asas da Brazuca (desculpem a catacrese), em pleno andamento da Copa do Mundo, nesse caso, mais grave ainda por se realizar em nosso próprio território, esqueço tudo e vou falar de... digamos, de mais uma aleivosia.

O Congresso Nacional tem até o dia 24 de julho para decidir se acata ou rechaça a tal Convenção 169, da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A Convenção é um dispositivo que parte ao meio a soberania do Brasil. Abre a possibilidade de criação de unidades independentes, política econômica e administrativamente falando. Ou o Brasil dá um basta na Convenção 169 ou a Convenção 169 racha o país.

A Convenção é um assunto tão maluco que dos 185 países-membros da OIT, só 17 concordaram em acatá-la. O Brasil é um dos que assinaram a tal estrovenga. Entre os que refugaram a investida estão Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália, e o Canadá. Acredito que se o negócio fosse bom, estes seriam os primeiros a aderir.

Ao se negarem a assinar o tratado internacional, os países-membros o fizeram por não admitir intromissões alienígenas a quebrar suas soberanias. No Brasil, a Convenção foi aprovada em Comissões do Senado em 20 de setembro de 1995.

Dias depois, o senador Romero Jucá (então PSDB-RR) entrou com um requerimento (1.304, de 4 de outubro de 1995), solicitando o reexame da Convenção por ambas as Comissões do Senado (CCJ e Comissão de Relações Exteriores - CRE), onde o texto já havia sido aprovado.

Na CCJ, foi retirado de pauta no dia 16 de março de 1999, a requerimento do relator, senador Bernardo Cabral (AM). Na CRE, obteve voto favorável do relator, senador Tião Viana (PT), hoje governador do Acre. Os integrantes da CRE seguiram o relator, chancelando a estrovenga. Exceção para os senadores Mozarildo Cavalcanti (então PFL-RR) e Lúdio Coelho (PSDB-MS).

Depois de todos os trâmites, o Decreto Legislativo 143, de 20 de junho de 2002, aprovando os termos da Convenção 169 da OIT – sobre direitos dos povos indígenas – foi promulgado em 19 de abril de 2004, com prazo para ratificação em 24 de julho de 2014, dez anos depois. Ou seja, daqui a pouco mais de um mês o país dirá se correrá ou não o risco de ver sua soberania dilacerada.

Especialistas que se debruçaram sobre a Convenção 169 da OIT garantem que o instrumento permite a criação de 216 países - dosse países - na Amazônia, retirando do Brasil a autonomia sobre quase 20% do seu território.

Roraima será atingido, por abrigar número considerável de Terras Indígenas (TIs) definidas. Em outras palavras, o tratado facilita a independência política, territorial e econômica de etnias indígenas. 

Graças a um artigo do Decreto Legislativo aprovado, o 39, o Parlamento brasileiro tem agora, no próximo mês, a chance de denunciar a Convenção, revisar o Decreto Legislativo ou até mesmo refutá-lo integralmente, livrando o país de mais essa mazela que tem berço no stabilishment anglo-americano. Quanto à Copa, bem... subimos o primeiro degrau. Avante, Brasil!

*O autor é jornalista e escritor

quarta-feira, 11 de junho de 2014

Ala anti-Dilma do PMDB surpreende e leva 41% dos votos; partido não está tão dividido desde 2002

Por Reinaldo Azevedo

O PMDB não vai tão dividido às eleições presidenciais desde 2002, quando ocupou o lugar de vice na chapa presidencial do PSDB, encabeçada, então, por José Serra. Frações do partido, na verdade, fizeram campanha para o então candidato do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.
O PMDB fechou, sim, nesta terça o apoio à candidatura Dilma e terá, mais uma vez, a vaga de vice, que continuará com Michel Temer. Mas o apoio está longe de ser unânime. A convenção nacional do partido decidiu apoiar a luta de Dilma pela reeleição por 398 votos a favor (59%) contra 275 (41%). 

Nem os prognósticos mais pessimistas (ou otimistas, a depender do lado em que se esteja) chutavam tão alto. Isso indica que o descontentamento no PMDB com o governo é gigantesco. Em 2010, o apoio a Dilma contou com a adesão de 84% dos convencionais.

A ala contra Dilma teve direito a discurso e chegou a distribuir panfletos. Um dos grupos mais ácidos com o petismo era o do PMDB do Rio. Não por acaso. Lindbergh Farias, candidato petista ao governo do Estado, ancora sua campanha nas críticas ao governo Sérgio Cabral, de que Luiz Fernando Pezão, o governador que concorre pelo PMDB, é herdeiro. 

Cabral foi um dos políticos que mais se desgastaram com as manifestações iniciadas em junho do ano passado. Os petistas não o socorreram. Ao contrário: ajudaram a pisar na sua garganta. Eduardo Paes, prefeito da capital, afirmou que o PMDB devolverá na mesma moeda eventuais críticas que sofrer do PT.

Até o presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que concorre ao governo do Rio Grande do Norte, reclamou da falta de solidariedade dos petistas em seu estado. O ex-ministro Geddel Viera Lima, que concorrerá ao Senado na Bahia na chapa da oposição a Dilma, afirmou que o apoio à presidente acabaria aprovado por causa de Michel Temer. E só por isso.

Enquanto o PMDB dava uns sopapos no governo, Dilma discursava em evento do PDT e acusava a oposição de oportunismo. Até parece que a função da oposição não é… fazer oposição! Ocorre que as coisas estavam se complicando pra ela era na situação mesmo!

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Eu não sou palhaço! Ou sou?

Por Francisco Espiridião

Paguei IPVA em cota única, seguro, taxas et al da moto e do carro no início de abril. Não que estivesse com prazo vencido. Longe disso. O final das placas, tanto da moto como do carro é 5. Portanto, o vencimento seria no último dia de maio. E dizem que ainda há uma tolerância. Mas tenho mania de pagar tudo adiantado. Isso, aliás, tem me causado sérias dores de cabeça. Mas eu não aprendo.

Um exemplo foi o dia em que eu encontrei um sujeito na rua e pedi para que transpusesse parte de uma carrada de seixo que havia sido derramada a metade no meio da rua, para dentro do quintal. Conversamos e o “cabra” me pediu 80 reais.  

Na maior das confianças, paguei-lhe os 80 mangos – mané é assim mesmo, confia em tudo e em todos, como diz a Eliana. Não sei por que eu não aprendo uma lição boba dessas.  Disse-lhe que no fim do dia voltaria para ver como havia ficado o trabalho. Voltei. Só para ter raiva. Foi eu sair pela direita, e ele se pirulitar pela esquerda. Não moveu uma pá de seixo do lugar para lugar nenhum.

Outro exemplo foi o IPTU deste ano da casa da Marcela. No primeiro dia aberto para pagamento, fui à prefeitura velha e paguei tudo o que era de IPTU cadastrado no meu nome. Calma, não são tantos assim. Isso, no dia 5 de maio. No dia 28 do mesmo mês, o carnê chegou à casa dela, que foi à lotérica e pagou. 

Na segunda-feira (2), apresentei-lhe o carnê que eu havia pago, crente que seria ressarcido. Então ela me mostra também o que havia pago. Pagamento dobrado. Perdi aí quase 100 mangos.

Mas isso é o de menos. Mania é mania e não tem jeito. Paguei adiantado o IPTU da moto e do carro, como disse. E dei um tempo para ir buscar o comprovante no Detran. Antes, eles eram mais corteses com o contribuinte. Entregavam-no em domicílio, via Correios. Mas isso é coisa do passado.

Esperei quase dois meses e lá vou eu, semana passada, buscar o tal Certificado de Registro e Licenciamento dos dois veículos. Com eles na carteira, ao cair em qualquer blitze, não tenho de passar por constrangimentos outros. A não ser que me depare com um “tarado”. Daqueles que investigam até chifre em cabeça de cavalo.

Cheguei todo confiante ao Detran. Fui pegar a senha para esperar – sentado – a hora de receber os tais documentos. Antes de me passar a senha, o funcionário me pergunta se eu mandei outro funcionário confeccionar tais documentos.

– É claro que eu mandei. Aliás, mandei não, eu solicitei. Afinal, eu não paguei pra isso? 

– Não, senhor. Aqui é diferente. Além de pagar, o que não é mais que sua obrigação, o senhor precisa ir ali, na terceira porta à direita, e pedir para confeccionarem os documentos.

Saí desconsolado. Mas, já que não havia outro jeito, fui bater na terceira porta à direita. Lá, o servidor me disse que, pelo meu CPF, não era possível descobrir número de placa. Eu precisava lhe fornecer os números. Como não decoro placa e estava de moto, tive que voltar em casa para anotar a do carro, vez que o documento havia ficado no porta-luvas.

Voltei. Entreguei ao atendente os números das benditas placas. Ele fez o procedimento e me disse que três dias depois eu poderia ir diretamente ao auditório, local em que entregam os documentos. E ressaltou: às 10h! O inusitado, para mim, estava na precisão de horário da entrega. Exatamente às 10h. Ainda quis questionar essa precisão toda, mas vi que era perda de tempo.  Resignei-me.

Três dias depois, lá estava eu, no auditório. Às 10h. Primeiro, peguei extensa fila para receber a senha. Cinco minutos para as 12h, chamaram o meu número. Que alívio! Aí, lembrei-me daquele bordão do Jô dos anos 80. “Eu não sou palhaço, mas estão me fazendo de palhaço!” 

Nada contra o meu amigo Leo Malabarista. Mas é como me senti.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Marqueteiro do PT leva mau diagnóstico a Dilma e Lula; presidente diz não saber razões de crescimento pífio do país; cresce o descontentamento

dilma furiosa
As coisas não andam bem para o lado de Dilma Rousseff (foto). Como vocês leram ontem aqui, uma pesquisa do Pew Research Center captou uma enorme insatisfação dos brasileiros com o governo. E em todos os setores relevantes. O Planalto vive um momento de notável desorientação. A alguns dias da Copa do Mundo, a presidente deveria estar lá nas nuvens. E, no entanto, ela não pode nem mesmo fazer um discurso no jogo inaugural. Ou levará uma vaia como nunca antes na história “destepaiz”. Não se dará nem mesmo um encontro com os jogadores da Seleção Brasileira. Não é o caso de a rapaziada se tornar sócia do mau humor que Dilma desperta em crescentes parcelas da população.
Segundo  a coluna Painel, da Folha, os dados de que dispõe o marqueteiro João Santana não são muito diferentes. Informa o jornal: “O publicitário traçou um cenário sombrio na reunião da campanha de Dilma Rousseff à reeleição, anteontem, no Palácio da Alvorada. Diante de Lula e da presidente, ele apresentou pesquisas mostrando que caiu a confiança do eleitor na capacidade do governo para promover mudanças. Até quem melhorou de vida nos últimos anos desconfia que sua renda pode parar de aumentar. A análise preocupou os petistas e deve exigir uma guinada na estratégia eleitoral”.
Pois é… Esse certo desalento se segue à campanha terrorista que o PT levou para a televisão, com aquele alerta sobre os “fantasmas do passado”. Comentei aqui, vocês devem se lembrar, que o partido já não tinha mais futuro a oferecer ao eleitorado e se limitava a seu trabalho deletério de sempre, que é destruir o passado alheio. Cansei, no entanto, de ler colunetas de supostos bastidores da política afirmando que a peça publicitária tinha sido um sucesso…
Nesta terça, já como parte do esforço concentrado de declarar que tudo está pronto para a Copa do Mundo — o que também não é verdade —, Dilma concedeu uma entrevista a jornalistas estrangeiros. Eles quiseram saber por que, afinal, o Brasil está crescendo tão pouco. E Dilma, vejam vocês!, foi de uma sinceridade estonteante. Disse um sonoro “não sei”. Se ela não sabe agora, como saberá depois? Que amanhãs vai oferecer ao eleitor? A que promessas apelará?
O descontentamento com o governo se estende às mais diversas áreas, segundo aponta o Pew Research Center, em quadro publicado pelo Estadão. Vejam:
descontentes com Dilma
É até possível que os candidatos de oposição ainda não sejam beneficiários desse descontentamento, até porque não são onipresentes na televisão como a presidente, seja na sua forma, digamos, “soberana”, seja por intermédio da propaganda institucional propriamente ou das estatais — sempre atreladas, ainda que de forma oblíqua, aos propósitos “reeleitoreiros” da presidente. Ainda que Dilma venha a ter um latifúndio no horário eleitoral gratuito, e a oposição, apenas um terreninho, o início da campanha dará mais visibilidade aos opositores do PT do que a que eles têm hoje.
Pesquisas e especulaçãoA situação da presidente é tão ruim que a Comissão de Valores Mobiliários decidiu investigar se não está havendo uma especulação viciosa no mercado financeiro envolvendo pesquisas. Ou por outra: o boato — ou eventual informação privilegiada — sobre a queda de Dilma deixa os investidores animados.
Aqui cumpre fazer uma observação: a CVM pode fazer o que quiser, mas não vai conseguir impedir que entes privados contratem pesquisas para se orientar. Não há lei que possa impedi-los. Os levantamentos para divulgação pública têm de ser registrados no TSE, mas não os encomendados por empresas ou partidos, desde que apenas para seu consumo. Voltemos lá ao início: aqueles que João Santana levou ao Palácio da Alvorada para orientar a campanha tinham, por acaso, registro? De resto, se o tal “mercado” está apostando contra Dilma, certamente não será por causa das virtudes da mandatária, não é mesmo?
A verdade é que há uma notável convergência em favor da mudança. Resta torcer para que não vença a conspiração reacionária do atraso.
Por Reinaldo Azevedo

Para juristas, decreto de Dilma põe país na rota do bolivarianismo

Por Laryssa Borges, na VEJA.com:


Na semana passada, sem alarde, a presidente Dilma Rousseff editou um decreto cujo objetivo declarado é “consolidar a participação social como método de governo”. O Decreto 8.243/2014 determina a implantação da Política Nacional de Participação Social (PNPS) e do Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), prevendo a criação de “conselhos populares” formados por integrantes de movimentos sociais que poderão opinar sobre os rumos de órgãos e entidades do governo federal. Que uma mudança tão profunda no sistema administrativo e político do Brasil tenha sido implantada pelo Executivo com uma canetada é motivo de alarme — e o alarme de fato tocou no Congresso nos últimos dias. Para juristas ouvidos pelo site de VEJA, contudo, o texto presidencial não apenas usurpa atribuições do Congresso Nacional, como ainda ataca um dos pilares da democracia representativa, a igualdade (“um homem, um voto”), ao criar um acesso privilegiado ao governo para integrantes de movimentos sociais.
“Esse decreto diz respeito à participação popular no processo legislativo e administrativo, mas a Constituição, quando fala de participação popular, é expressa ao prever como método de soberania o voto direto e secreto. É o princípio do ‘um homem, um voto’. Mesmo os casos de referendo, plebiscito e projeto de iniciativa popular têm de passar pelo Congresso, que é, sem dúvida, a representação máxima da população na nossa ordem constitucional”, diz o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Velloso.
“Sem dúvida isso é coisa bolivariana, com aparência de legalidade, mas inconstitucional. Hugo Chávez sempre lutou para governar por decreto. Nicolás Maduro, a mesma coisa. Isso está ocorrendo também na Bolívia e no Equador. É um movimento sul-americano esse tal constitucionalismo bolivariano, mas é algo que pugna pelo fortalecimento do Executivo, por uma ditadura e que prega a vontade dos detentores do poder. O problema desse constitucionalismo é que ele é um constitucionalismo que não é. Constitucionalismo pressupõe liberdade, Estado constitucional e vontade da lei, e não dos homens”, afirma Velloso.
Para o ex-ministro da Justiça Miguel Reale, o decreto é eleitoreiro: “Dilma ganha diálogo com os movimentos sociais e pode dizer ‘eu dei poder para vocês’”.
“É uma democracia pior que a Venezuela, uma balbúrdia, um caldeirão. É mais grave do que os governos bolivarianos da América do Sul, porque esse decreto reconhece que movimentos não institucionalizados têm o poder de estabelecer metas e interferências na administração pública. Qualquer um pode criar um organismo para ter interferência”, completa Reale. O jurista se refere ao fato de que o decreto, no inciso I do artigo 2o., traz uma definição de sociedade civil que compreende “os movimentos sociais institucionalizados ou não institucionalizados”.
Na avaliação do ministro Gilmar Mendes, do STF, a criação dos conselhos populares também abre espaço para dúvidas sobre a representatividade daqueles que serão responsáveis por discutir políticas públicas. “À medida em que essas pessoas vão ter acesso a órgãos de deliberação, surge a dúvida de como vão ser cooptados, como vão ser selecionados. Se falamos de movimentos sociais, o que é isso? Como a sociedade civil vai se organizar? O grande afetado em termos de legitimidade de imediato é o Congresso”, afirma. “Tudo que vem desse eixo de inspiração bolivariano não faz bem para a democracia.”
OAB
A Comissão de Estudos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) analisa a possibilidade de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar barrar a medida. Ao site de VEJA, o jurista Valmir Pontes Filho, que preside a comissão, afirmou que o decreto é “realmente preocupante” porque “há várias indicações de conflito com a Constituição”.
“As discussões no Congresso de derrubada do decreto são utilíssimas porque o decreto não é tão aprimorado do ponto de vista redacional. Ele é muito confuso e há várias indicações de conflito com a Constituição. Esse exame preocupa todos nós. É um decreto polêmico e realmente preocupante”, disse Pontes.
No Congresso, dez partidos pressionam para que seja colocada em votação a urgência de um decreto legislativo para anular o texto presidencial. A frente esbarra, entretanto, na resistência do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), que teme desagradar Dilma. Pré-candidato ao governo do Rio Grande do Norte, Alves não quer comprar briga com o Palácio do Planalto às vésperas de inaugurar o novo aeroporto de São Gonçalo do Amarante na segunda-feira – ao lado da presidente.