segunda-feira, 25 de julho de 2016

UM DIA MEMORÁVEL NA DOÇURA EXISTENCIAL DE UM JOVEM ESPECIAL

Por Francisco de Assis Campos Saraiva

                        Ao despertar na manhã de hoje, dia 25 de julho de 2016, visualizei no WhatsApp de meu celular, uma mensagem sublime de amor e gratidão, um gesto altaneiro de uma beleza rara, que pouco se constata na geração de jovens da atualidade. Confesso que fiquei deveras emocionado e os olhos marejando da inusitada alegria, que parecia tomar conta de mim por inteiro. E fui discorrendo no texto, palavra por palavra e vi a beleza magistral de uma criatura dotada de inusitadas virtudes e de uma sinceridade impar a toda prova. 

E a mensagem começava assim: “Meu prezado avô Dr. Saraiva. É notória a importância que o Senhor tem na minha vida. Sempre esteve ao meu lado, me aconselhando e me ensinando a seguir no caminho certo. Nos momentos que precisei de um PAI, quem fez esse papel foi o Senhor. Lembro-me como se fosse hoje às vezes que me acompanhou na escola, naquelas datas memoráveis, tais como dia dos pais, dia das crianças, comemorações que um pai ao lado faz toda a diferença e sou grato por ter feito esse papel com dedicação. Tenho orgulho de dizer que sou neto do Dr. Saraiva, encho a boca para enaltecer o Senhor, um cidadão merecedor dos melhores aplausos. Quero que saiba que sempre estarei ao seu lado, lhe apoiando, lhe ajudando, pois é bíblico, devemos honrar pai e mãe. Devo frisar que nos momentos de provações, estive ao seu lado com amor e carinho; memorável as madrugadas que passamos juntos, e graças a Deus sua coluna foi restabelecida. E nunca esqueça que as provações são necessárias para medirmos a nossa fé. Deus honra os que madrugada lhe buscam, por isso sempre busco Ele diariamente. Obrigado por tudo meu avô. O homem e profissional que eu sou hoje, eu devo a uma pessoa, e esse alguém se chama Francisco de Assis Campos Saraiva; através dos seus ensinamentos cresci na vida. Com o convívio diário, a tendência é que o crescimento profissional e pessoal aumente. Vale ressaltar que tenho prazer em trabalhar com o Senhor no Laboratório; dedico-me o máximo, visto a camisa da empresa e procuro me aperfeiçoar cada dia mais; no futuro irei encher a boca pra dizer que aprendi tudo com o Senhor. Todos os sermões e advertências foram essenciais para a formação do meu caráter. Mediante a isso sou muito grato por tudo meu querido avô. Obrigado de coração. Conte sempre comigo. Lucas Saraiva.”.

                        Gente amiga. Que maravilha! O amor e a gratidão exaltados nas palavras meigas e sinceras de um jovem talentoso que, hoje, exatamente hoje, está completando 20 anos de bela existência.  Lucas Saraiva é um Cearense, nascido em Fortaleza, à bela Capital e veio para Boa Vista quando ainda tinha tenra idade, razão porque ama esta cidade de todo o seu coração. Realmente acompanhei os seus passos em todas as direções, sendo para ele um lídimo pai, que o deu amor, carinho, assistência total, razão pela qual nutre toda essa afeição por mim. Lucas Saraiva é aquela joia rara de pessoa que Deus colocou em meu viver. Uma criatura maravilhosa dotada de ricas virtudes, dádiva preciosa do Criador. 

Tem de mim uma herança genética valiosa, razão porque se coaduna comigo em grande parte das ações exercitadas. É um jovem dinâmico, inteligente, de estatura alta, aparência bonita, visual agradável e de um relacionamento pessoal fascinante aos olhos dos que estão em sua volta. É de uma comunicabilidade social invejável, razão porque da admiração que goza das pessoas com quem se comunica. É temente a Deus e louva a Sua grandeza em todos os momentos que lhe são oportunos. É trabalhador, honesto, dedicado e dotado de um espírito de renúncia admirável. Bom filho, bom neto, bom amigo e destaca o estudo e o trabalho como fatores primordiais na transcorrência de seus dias. 

Está ao meu lado em todos os momentos que se façam mister pois é sabedor que um cidadão de 78 anos idade tem suas limitações no dia-a-dia, por mais dinâmico que pareça ser. É uma questão de vida em que todos passam pelo crivo do tempo, pois é uma lei natural do Criador. Sou agradecido ao Pai Eterno por ter me dado um neto tão prestimoso e tão salutar em meu viver. Sempre está ao meu lado, por mais difícil que o momento pareça ser. Realmente lhe fiz o papel de verdadeiro pai em todas as ocasiões de sua vida, principalmente nas datas de maior relevância que carecia que estivesse ao seu lado, como bem frisou em sua evocação de amor, nos dias dos pais, dia das crianças, deixando-o feliz e contente como as demais crianças presentes. E após a solenidade, ia com ele brincar e nos divertir nos brinquedos e nos embalos pertinentes as crianças. E tudo isso deixou em mim a marca da imensa saudade que ficou para sempre em meu coração.


                        Parabéns, Lucas Saraiva, pela linda data que hoje ver brotar no jardim perene de sua magnânima existência. Tenha certeza que Deus, o Soberano Pai e Senhor, estará sempre a seu lado, fazendo acampar os anjos de proteção em sua vida, em todas as frações de segundo de seu viver. Que você seja um exemplo edificante, de dignidade e retidão e um paradigma a ser seguido pelas gerações vindouras. O adágio oriental reporta: “Existem pessoas que não se tornam especiais pela maneira de ser, ou de agir, mas pela profundidade com que atingem nossos sentimentos.” E a palavra de Deus reporta: “Como é grande a tua bondade, que reservaste aos que te temem, da qual usas, perante os filhos dos homens, para com os que em ti se refugiam!” (Salmos 31.19).

Boa Vista – Roraima, 25 de Julho de 2016.
________________________________________________
Dr. FRANCISCO DE ASSIS CAMPOS SARAIVA
Oficial R1 do Exército
Escritor e Empresário
Membro da ALB e da ALLCHE
E-mail: ldalmada@hotmail.com
Avô de Lucas Saraiva Neto

A doença saudável




Durante uma visita a uma loja de produtos naturais, a blogueira Jordan Younger, 25, entrou em pânico: o estabelecimento em Nova York não tinha o suco de vegetais que ela queria. Jordan passou cerca de 15 minutos em dúvida, analisando as opções disponíveis, enquanto suas amigas esperavam uma decisão – que não veio. Diante da angústia, ela sugeriu que fossem a outra loja da mesma franquia. As três andaram 1,5 km até o local onde Jordan, aliviada, encontrou a bebida. “Tinha pavor de comer ou beber algo que não havia planejado. Eu precisava de comida e não me permitia comer por 5 bilhões de motivos, que são difíceis de explicar”, desafabou em seu blog, então voltado ao veganismo.

No post, a norte-americana descreve o ponto alto da angústia causada por um distúrbio ainda pouco conhecido: a ortorexia nervosa. O problema aparece quando a preocupação em comer de forma correta vira obsessão – inclusive com características de TOC (transtorno obsessivo compulsivo). Ao contrário da anorexia ou bulimia, que visam exclusivamente a relação com o peso, o foco da ortorexia é totalmente voltado à saúde – que pode resultar em perda de peso, mas o objetivo é sempre estar “puro”. Uma ideia fixa que leva a frase "que seu remédio seja seu alimento e que seu alimento seja seu remédio" a um ponto ironicamente doentio.

“Só me sentia confortável em comer vegetais, batata doce, quinoa e, ocasionalmente, suco verde com um pouco de banana”, contou Jordan ao TAB, sobre o processo em que o ortoréxico restringe mais e mais sua alimentação, até que se conte nos dedos (e de uma única mão) os componentes do cardápio. A “bolha de restrição” segue uma lógica diferente para cada paciente, que se apodera do tom médico em suas justificativas: esse alimento dá alergia, aquele atrapalha a digestão, o outro reforça a asma. 

A vida e o pensamento do ortoréxico giram em torno da comida, a ponto de a alimentação definir sua autoestima e seu valor pessoal. Enquanto o anoréxico nunca se vê magro o bastante, o ortoréxico nunca se sente puro o bastante – e acha que a solução pode estar naquilo que ingere. A forma como ele come é mais importante do que trabalho e vida pessoal. Outra interpretação extrema, agora de outra máxima: “você é o que você come”.

BATALHA INTERNA

“Não chega a ser uma questão de saúde pública. Mas estamos em um surto de ortorexia, como ocorreu nos anos 80 durante a onda macrobiótica [que prega o consumo de cereais integrais, grãos e vegetais para manter o bem-estar físico e emocional]”, afirma Eduardo Aratangy, médico supervisor do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, em São Paulo.

A instituição não divulga o número de casos tratados, porém algumas características são comuns entre os pacientes: sexo feminino, entre fim da adolescência e 25 anos, muito preocupadas com o corpo, moradoras de ambiente urbano e de classe econômica elevada. “Esses traços favorecem, mas não determinam a existência da patologia. Se não, seria como dizer que todo apreciador de cerveja tem problemas com álcool”, afirma Aratangy.

O principal desafio em lidar com a ortorexia está justamente na máscara dos hábitos saudáveis – o distúrbio vem em uma embalagem cheia de vantagens e tem grandes chances de agradar, quando o legal é ter um #estilodevida baseado nas hashtags #clean #orgânico #comidasaudável e #foco, para citar alguns poucos exemplos.

No caso da ortorexia, a qualidade dos alimentos ingeridos não tem impacto só no corpo, mas também na identidade, fazendo com que a pessoa se sinta superior aos demais por seguir sua dieta à risca. Em contrapartida, qualquer falha - desde a ingestão de uma única uva passa até uma pizza inteira seguida por um pote de sorvete - leva à punição: um cardápio ainda mais restrito e até períodos de jejum para desintoxicar. Afinal, no pain, no gain.

Hashtags e frases motivadoras movem o mundo fitness na rede social Instagram, “a melhor plataforma para estudar distúrbios relacionados ao corpo”, como define Joana Novaes, psicanalista e coordenadora do núcleo de doenças da beleza da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio). “Muitos não se dão conta do problema, porque acreditam ser e parecem ser saudáveis. Ganham aplausos, são vistos como disciplinados, viram alvo de admiração. O distúrbio só fica evidente quando o ortoréxico passa a evitar relacionamentos, lugares e eventos que não lhe garantem o controle sobre a procedência e o preparo da comida”, afirma.

Segundo Joana, é isso que diferencia a preocupação em ser saudável (seria melhor comer tal coisa) de uma patologia (só como se for tal coisa). Por causa da obsessão – “eu mesmo vou à feira”, “eu mesmo escolho o tomate orgânico”, “eu mesmo o preparo”, “o que exatamente tem nesse suco?” -, especialistas colocam a ortorexia sob o guarda-chuva do TOC e não de outros distúrbios alimentares, apesar de haver características em comum. Outro agravante nessa intensa perseguição da saúde pode vir da prática de exercícios físicos, que os ortoréxicos associam cada vez mais a seus cardápios restritos, criando assim o falso combo do bem-estar.

Era este o caso de Kate Finn, que ganhava a vida como instrutora de ioga nos Estados Unidos e mantinha uma dieta à base de vegetais crus, frutas, grãos e sementes. A combinação fez com que ela perdesse muito peso e fosse diagnosticada com anorexia quando chegou aos 43 quilos. "Me sentia incompreendida. Pensavam que eu tinha medo de ficar gorda, mas meu foco em todas as dietas que experimentei era ser saudável", escreveu. 

Ao ler um artigo sobre ortorexia, Kate Finn se identificou com os sintomas e passou a tratar o problema, buscando equilíbrio na alimentação. O esforço não bastou: morreu em 2003, aos 37 anos, vítima de uma parada cardíaca associada a seu corpo debilitado.

quinta-feira, 7 de julho de 2016

RORAIMA Idéias e salários engessados

Francisco Espiridião (*)

Muitos são os envolvimentos que engessam a atuação do jornalista, colocando-o numa camisa de força no exercício de sua missão de arauto da sociedade. Em princípio, tal conceito pode até parecer meio boçal. Mas só parece. No frigir dos ovos, é recheado de sentido: duas vezes por ano a Universidade Federal de Roraima despeja no mercado um número considerável de novéis profissionais com canudo de bacharel em Comunicação Social, Habilitação em Jornalismo, debaixo do braço.

A esses "foquinhas" (referência carinhosa e nada pejorativa, entenda-se) há de se somar um pelotão de iguais que migram de outros estados para Roraima, porque ouviram falar que o Eldorado dos tempos ultramodernos está acima do Equador.

Todo esse contingente chega voraz, em busca de uma vaga num mercado de trabalha que, pela globalização crescente, jamais esteve tão depauperado como agora. Nesse quadro caótico, nada mais natural que haja um engessamento – das idéias e da carreira.

O axioma "o pequeno é quem sempre se dá mal" é a mais crua realidade na área do jornalismo informativo. Nem sempre o que se vê publicado no jornal do dia seguinte é o que realmente aconteceu. Apesar de divulgarem simultaneamente os mesmos fatos, os variados veículos dão à notícia maior ou menor ênfase, dependendo da ideologia de seus donos. Isso obriga o leitor a navegar pelas páginas dos diversos jornais para, a partir daí, tirar suas próprias conclusões. Não dá para acreditar na primeira versão que lhe chega às mãos.

Ao bel-prazer desse emaranhado de interesses, tal como o marisco entre o mar e o rochedo, navega indefeso o jornalista, este ser híbrido e ao mesmo tempo inteligente, que se adapta com facilidade às boas veias do patrão. Se para conseguir colocação numa redação ele precisa brigar, não vale a pena arriscar tudo numa posição ideologicamente firme. É mais conveniente submeter-se a dar a versão dos fatos que mais interessar ao patrão.

Salário-padrão

Mas todo esse imbróglio ainda não é o principal. Ainda há a parte crucial da questão: o salário pago a esse contingente de "manés" (e eu sou um deles). A revista Veja da semana retrasada trouxe levantamento das 17 profissões mais procuradas pelos jovens que prestam vestibular no país. O jornalismo estava nesse bojo.

A pesquisa da Veja mostrou, como média salarial do jornalista brasileiro, 7 mil reais. Um salário mais do que razoável. Afinal, não é toda profissão que paga entre 7 mil e 8 mil reais de salário mensal, ainda que exija 10 anos de experiência. Mas o bicho pega mesmo é quanto à operacionalização desses valores.

Pelo menos no que me é dado a conhecer nestes quase 20 anos de profissão, nenhum jornalista em Roraima consegue um contracheque desse volume. Fato mais do que normal, considerando-se que o mercado local é incipiente. Mesmo assim, não quero aqui afirmar que ninguém o receba. Só que, para chegar a esse nível de vencimentos, o jornalista roraimense precisa dar uma de equilibrista e esquecer o emprego formal (muitas vezes, até a ética e a vergonha na cara).

Precisa correr para formalizar seu próprio salário, com venda de publicidade para os órgãos em que trabalha ou outros meios que o valham. E aí já não é mais salário: pode-se chamar de dividendos, bonificações, comissões, até mesmo "jabá". Jamais salário.

Aliás, salário de jornalista por estas bandas, na mais lídima acepção da palavra, é curtíssimo. A esperança é que um dia ainda tenhamos em Roraima um sindicato que brigue pelos interesses de seus associados.

Salvo melhor juízo, a última vez que o Sinjoper se reuniu para falar de salários (acordo coletivo) já faz mais de cinco anos. Parece que nós só somos competentes para alardear o que está errado na área dos outros. Cobrimos todas as greves que surgem. Somos até aguerridos na defesa dos mais fracos. Mas não sabemos fazer uma – por pequena que seja – em nosso próprio benefício.

Chega de vias transversais. A imprensa e a sociedade roraimenses estão há muito merecendo que os jornalistas e o Sinjoper de Roraima façam alguma coisa para estabelecer no estado um salário-padrão que, se não chegar aos oito mil reais mensais, pelo menos permita uma vida tranqüila ao profissional e a sua família.


(*) Jornalista

PS: Este artigo foi escrito em julho de 2003, publicado originalmente no site Observatório da Imprensa http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos/fd010720033.htm e hoje, 13 anos depois, a situação ainda é a mesma. Nada mudou.

terça-feira, 5 de julho de 2016

O STF e o império da lei

Mauro Santayana
Na última semana, juízes e membros do Ministério Público, em São Paulo,  manifestaram sua contrariedade e declararam-se “perplexos”, com a decisão da Suprema Corte, por meio do Ministro Dias Toffoli, de mandar soltar Paulo Bernardo, detido em Brasília, diante de seus filhos, em um apartamento pertencente ao Senado Federal, em espetaculosa ação da Polícia Federal que contou com a participação de numerosos homens e até mesmo de um helicóptero, como se o ex-ministro fosse um perigoso traficante de drogas, uma espécie de Pablo Escobar, entrincheirado em uma inexpugnável fortaleza no deserto, na fronteira sul dos EUA. 

Têm os nobres procuradores todo o direito de ficarem perplexos com a decisão do Ministro Toffoli.
Como têm os cidadãos brasileiros - pelo menos aqueles que não fazem parte da manada psicótica manipulada por parte da mídia desde 2013 - o direito de, por sua vez, ficarem perplexos com a “perplexidade” dos procuradores, diante da clareza cristalina do que afirma a lei nesta República, a propósito das garantias aos direitos individuais, da presunção de inocência e do mais amplo direito de defesa que devem proteger o cidadão frente ao sistema e ao Estado, sempre que seu poder for distorcido ou exacerbado.

Nunca é demais lembrar, reza a Constituição Federal, no Artigo 5:
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;
LVII- ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”;

E o Código Penal:
“Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

“Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Nos últimos tempos, têm se estirado e retorcido, como se fossem de látex, os princípios da lesividade; da materialidade; da culpabilidade; da velha e justa premissa  “in dubio pro reo”; da jurisdicionalidade; do princípio acusatório; do princípio do encargo da prova - é à acusação que cabe provar a responsabilidade criminal do suspeito; e o do contraditório.

A prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, da forma como foi executada, é mais um indício, sutil como um elefante, de o país em que estamos nos transformando, e dos riscos que corre, no Brasil de hoje, a Democracia.

É da natureza humana a extraordinária sede de poder daqueles que têm algum poder.
E é por isso que a distorção e a desobediência ao espírito da Lei precisam ser combatidas, principalmente quando cometidas por agentes do Estado, porque depois, com o passar do tempo, elas se tornam mais intensas e  profundas e não podem mais ser controladas.

Uma coisa é o combate real à corrupção. Outra, o discurso por trás dele, que, na maioria das vezes, ao contrário do que pensa a maioria, não é usado apenas  pelos mocinhos, mas principalmente pelos bandidos.

Pinochet, Suharto, Salazar, entre muitíssimos outros, e, principalmente, Mussolini e Hitler, dele fizeram sua bandeira e seu diabólico e demagógico ariete contra a Democracia, usando-o para abrir caminho para o poder, e para  implantar em seus países e mais tarde em toda a Europa ocupada um regime de terror assassino e demente, responsável pela prisão, a  tortura e o genocídio de dezenas de milhões de pessoas.

Nem serve, como muitos o vêm também, de panaceia para nada.

A Itália, terra da Operação Mãos Limpas, continua tão ou mais corrupta - ou corruptível - como antes, como se pode ver pelos mais recentes escândalos envolvendo a Velha Bota, e mesmo na China comunista - onde é punida quase que  sumariamente  com a morte - a corrupção continua existindo, porque o que muda uma Nação não são operações  jurídico-policiais, em si, mas alterações e aperfeiçoamentos reais no sistema político.    

O Inferno - como o próprio demônio vive repetindo, satisfeito  - está cheio de boas intenções.
O discurso de combate à corrupção não pode, como está ocorrendo no Brasil, se sobrepor ao desenvolvimento nacional,  aos Três Poderes e às  instituições.

Ele não pode estar acima da Democracia, que é, por natureza, tão diversa quanto problemática - já que reflete, como ocorre em qualquer país do mundo, os problemas e defeitos de toda a sociedade - mas que representa ainda o melhor regime encontrado nos últimos 2.500 anos para regular a vida das nações, dos estados, das comunidades e dirimir as diferenças dos variados grupos sociais.

Nem pode se arvorar em juiz do regime político vigente, ou do sistema de presidencialismo de coalizão, já que esse tipo de prerrogativa é atributo exclusivo do Legislativo - eleito pelo voto soberano de dezenas de milhões de brasileiros - e não de juízes de primeira instância, nem de policiais federais, nem de procuradores, que não tem função de mando nem de comando, e são - com todo o respeito que mereçam pelo seu trabalho - meros servidores do Estado.

Se tem gente, nessas instituições, que acha que ao passar em concurso, foi escolhido pelo destino para “consertar” o país - os nazistas pensavam o mesmo sobre a República de Weimar - eles devem afastar-se de suas respectivas carreiras e disputar, no voto, uma cadeira na Câmara ou no Senado, ou em uma Assembleia Nacional Constituinte.

E parar de acreditar que vão fazer isso  prendendo a torto e a direito, sem nenhum respeito pela Lei e a Constituição, políticos e empresários, com base em ilações forçadas e em delações “premiadas” dignas da Alemanha Nazista ou da União Soviética de Stalin.

Principalmente, quando eles mesmos não são perfeitos - é preciso lembrar que não existe corporação nenhuma que o seja, em nenhum lugar do mundo - como demonstram:

 a) - A prisão de dois adolescentes, separadamente, em duas cidades do interior de São Paulo, por terem “ousado” - apoiando-se no direito de expressão, um dos princípios basilares da Constituição Federal - criticar a polícia em comentários nas redes sociais.

b) - Os mais de 70 juízes "condenados" a bem do serviço público, a continuar recebendo integralmente altíssimos proventos depois de "aposentados",

c) - As dezenas de processos movidos por juízes e procuradores do Ministério Público, contra o jornal Gazeta do Povo, do Estado do Paraná - estado onde fica a "República de Curitiba" - por este ter denunciado, publicando documentos comprobatórios, que os proventos das duas classes passaram de 550.000 reais per capita no ano passado, muito acima, portanto, do teto legal correspondente ao salário de Presidente da República.

Processos criticados pela ministra Carmem Lúcia e suspensos por decisão da Ministra Rosa Weber, há poucos dias, em outra medida  extremamente louvável do STF, voltada para o restabelecimento de um mínimo de bom-senso e de respeito à legalidade no universo jurídico nacional.

Está se produzindo no Brasil uma espécie de macarthismo tupiniquim que - ao contrário também do que pensam muitos - será, como ocorreu nos EUA, duramente condenado pela História.

Cabe ao Supremo Tribunal Federal decidir se seus membros agirão com coragem e dignidade, como guardiões da Lei e da Constituição, nesta desafiadora fase da vida nacional, ou se, por pressão de parte da mídia e da massa  ignorante e intolerante que ela manipula, acabarão cedendo e aceitando tornar-se silenciosos cúmplices de uma tragédia anunciada, que não se encerrará agora, e que, pelo contrário, poderá se aprofundar com a entrega do país ao fascismo nas eleições presidenciais de 2018.  
Estamos agindo como se o pseudo combate à corrupção - no caso, uma doutrina jurídica que solta corruptos ou os  “condena” a passar um ou dois anos em nababescas mansões - e pune homens públicos sem sinais de enriquecimento ilícito ou contas na Suíça a pesadas penas de prisão por atos de natureza político-partidária-eleitoral, não trouxesse, para o país, pesados danos colaterais, ou fosse, de per si,  o mais alto objetivo nacional neste momento, justificando, direta, indireta, kafkianamente, todo tipo de ilegalidade e despautério.

Algumas das maiores empresas do Brasil, de todos os matizes e áreas de atuação, são invadidas por membros das forças de segurança praticamente a cada novo dia, prejudicando seu crédito, seu valor, seus acionistas, os seus trabalhadores e suas famílias - demitidos às dezenas de  milhares - seus mercados, sua credibilidade externa, seus projetos - que são interrompidos - e centenas de pequenos e médios fornecedores que as atendem, que também passam a quebrar e  a cortar funcionários em nefasta reação em cadeia.

Gigantescos projetos, de refinarias, plataformas de petróleo, complexos petroquímicos, irrigação e saneamento, navios, ferrovias, rodovias, energia, defesa - que não eram executados nessa dimensão e amplitude há décadas - são embargados judicialmente ou atrasados indefinidamente, seguindo o curioso raciocínio de que, para tentar achar, em uma obra, 2 ou 3% de suposta propina - o dinheiro arrecadado até agora em recuperação de desvios é pífio, por isso se recorre a “multas” para justificar o seguimento dos processos - não interessa se os outros 97% forem transformados em sucata, provocando bilhões e bilhões de dólares em prejuízo, ou se no final serão lançados, na prática, técnica, empresarial, e estrategicamente, no  lixo.

O programa do submarino atômico brasileiro está sendo investigado, o almirante responsável pelo bem sucedido programa nacional de enriquecimento de urânio foi preso, o controlador da empresa responsável pela construção do míssil A-Darter da Aeronáutica encontra-se detido.

Essa situação está abrindo caminho para a entrega da indústria bélica brasileira a controladores estrangeiros, depois de anos de esforço da iniciativa privada e das Forças Armadas, para evitar que isso ocorresse.

É preciso não esquecer, nunca, que a criminalização da política - com a desculpa de se dar combate à corrupção e o recurso a um anticomunismo hidrofóbico, anacrônico, psicótico e obtuso -  é a pedra fundamental dos governos totalitários.

No Brasil, essa combinação nefasta levou ao fim da Democracia; a várias tentativas de derrubar Juscelino Kubitschek, de inviabilizar Brasília, os programas de industrialização e modernização do país, de energia e transporte; e ao suicídio, com um tiro no peito, do Presidente Getúlio Vargas.
Carlos Lacerda, apelidado de "O Corvo", símbolo e quintessência do golpismo hipócrita, canalha, entreguista e mau caráter, dizia de JK, em uma frase digna de um manual da CIA à época da Guerra Fria, que tornou-se uma espécie de roteiro estratégico dos golpistas latino-americanos: "esse homem não pode ser candidato. Se for candidato, não pode ser eleito para a Presidência da República. Se for eleito, não podemos permitir que governe, e se governar, ele tem que ser derrubado".

Os “políticos”, como chamados, genericamente, pela massa conservadora  que os despreza e odeia - com todos os seus defeitos, que espelham a formação, limitações e idiossincrasias de seus eleitores - estão longe de ser perfeitos.

E isso não ocorre apenas aqui, mas em todas as nações democráticas do mundo.
Mas é a eles que pertencem os votos.

Votos que, não interessa a quem sejam dirigidos, se escudam no sagrado artigo primeiro da Constituição Federal, que reza  que “todo o poder emana do povo e em seu nome será exercido”.
É esse poder que deve ser respeitado e obedecido, acima de todos os outros, que dele derivam, como base e introito da Constituição, da República, da Lei, da  Democracia e da Liberdade.

Há quem tenha se habituado, nos últimos tempos, a tratar o voto como se este fosse um aspecto secundário da vida política nacional, que pode ser questionado, desrespeitado, relevado ou contornado, com base em ações de um ou outro segmento do Estado ou  da opinião pública.

A atual caça às bruxas deriva da íntima convicção que têm setores do Ministério Público, da Polícia Federal e da Magistratura - não todos, graças a Deus - de que foram indiretamente escolhidos por Ele, por meio de concurso, para consertar o país, punir e exemplar a “classe” política, e corrigir distorções eventualmente criadas pelo voto “equivocado” - que na verdade é direto e soberano - de milhões de cidadãos brasileiros.


Trata-se de temerário e perigoso engano.

O papel da Polícia, do Judiciário, do Ministério Público, é fazer cumprir a lei, e, para isso, é preciso obedecê-la, primeiro,  de forma plena, rigorosa e  respeitosa.

E o papel de julgar, moralmente, seus representantes, é do povo brasileiro - por meio da urna -  e não de instituições que estão ali para ser igualmente julgadas pelo povo e para servir à população que paga, com seus impostos, seus salários.

Nesse aspecto manda mais o eleitor do que o Juiz, o Policial, o Procurador.

Já que é preciso entender e reconhecer o fato, cristalino, de que trabalhar para o cumprimento da Lei não coloca ninguém acima da própria.

E que é necessário compreender que o exemplo tem que partir dos servidores do Estado, que a ela devem a mais estrita obediência e observância dos grandes princípios que a norteiam. 

No Brasil de hoje, parece que nos esquecemos de tudo isso.

Como nos piores regimes autoritários,  instalou-se, na parte mais intolerante e ignorante da população e em certos setores do Estado, um clima de desatado linchamento que justifica e promove a prisão de brasileiros sem nenhuma prova, na maioria das vezes apenas com base em delações e ilações, e joga-se a chave da cela fora até que o cidadão, abandonado praticamente à própria sorte, invente uma história qualquer para delatar o próximo da fila,  igualmente sem provas, para reaver alguma perspectiva de liberdade.

Nessa situação  absurda e surreal, que só chegou onde chegou porque não foi corrigida, controlada, desde o início, e deixou-se correr solto o processo de formação de um consenso jurídica e constitucionalmente insustentável, por meio do estabelecimento de um comportamento de boiada em alguns segmentos da opinião pública, que, entre outras coisas,  insultam, ameaçam, impune e permanentemente, todos os dias, juízes do STF e a própria instituição, nos portais e redes sociais.

Pretende-se impor, na base da  pressão intensa e diuturna dessa parte da população - da  qual fazem parte grupos nada “espontâneos” - a vontade de juízes de primeira instância, procuradores e policiais, não apenas ao Supremo Tribunal Federal, mas também ao Congresso Nacional e ao Executivo, como se o poder de que dispõem para fazer o que estão fazendo fluísse de fonte própria, e não do próprio Legislativo, que tem a prerrogativa, garantida por milhões de votos,  de organizar-se a qualquer momento - nesse caso, com imprescindível urgência - para votar e alterar leis que tolham eventuais excessos e arbitrariedades, permitindo  a correção da perigosa rota que estão tomando os rumos nacionais.

Os juízes têm que parar de decidir por pressão da mídia e dos internautas que habitam o espaço de comentários dos portais e redes sociais - internautas que acham que podem obrigar o país a fazer o que lhes dê na telha - e de promover o espetáculo e a evidência para, ao buscar a aceitação e a admiração dessa minoria - porque de minoria se trata, não haja dúvida, como vemos nas últimas pesquisas - alimentar o seu ego e sua vaidade, e, em última instância, suas eventuais pretensões políticas ou eleitorais.    

Se os juízes e procuradores quiserem alterar o texto da lei, ou fazer política, devem recolher-se a seu papel constitucional, e preparar-se, com todos os ônus dessa decisão, para  candidatar-se, no momento certo, como representantes.   

Até lá, só lhes resta aceitar e acatar as decisões do Supremo Tribunal Federal e do próprio Congresso Nacional, que possui - com todos seus eventuais defeitos -  poder para legislar do modo que bem lhe aprouver.

E ao Supremo Tribunal Federal, continuar trabalhando, paulatinamente - mas com firmeza cada vez maior - frente à Nação e à História, no fortalecimento de suas prerrogativas e autoridade,   que estão sendo desafiadas constantemente por ameaças e pressões de todo tipo.

Restaurando plenamente o Império da Lei e do Estado de Direito, para fazer cumprir, de forma clara, transparente, incontestável, o que está escrito na Constituição da República.

(Publicado originalmente no Jornal do Brasil)