terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

O jornalista e o assessor de imprensa



Por Francisco Espiridião 

Ainda que o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros não cite textualmente, existe uma diferença fundamental entre o jornalista e o assessor de imprensa. O jornalismo, por sua essência, é crítico. Bicho solto. Não aceita cabresto. O compromisso firmado é com a própria consciência. Poucos são os que conseguem isso, haja vista muitos serem os entraves naturais nesse mundo hipócrita e dissimulado em que vivemos. 

Já a assessoria de imprensa, esta mantém compromisso com o órgão a que se propõe apoiar. Não se quer aqui dizer que o jornalismo seja altruísta e a assessoria de imprensa, subserviente. Cada um destes segmentos - jornalismo ou assessoria - tem, com a maior clareza, os percalços da estrada a que se propõe percorrer. Seja ela esburacada ou devidamente pavimentada. Vale ressaltar que tanto uma como a outra  são atividades dignas. Uma não desmerece a outra, apesar de, como água e óleo, não se misturarem.

O jornalismo tem como escopo uma visão ampla da sociedade e para ela deve dar a última gota de sangue, deve ir às últimas consequências. O jornalismo, de fato, tem como principal mote a independência editorial. Esta deve estar à frente de todo o processo de criação. Enfim, o jornalismo é um órgão fiscalizador das instituições públicas.  

Já a assessoria de imprensa abraça um projeto restrito ao perímetro que lhe cabe, ou seja, sua ação é previamente delimitada e tem um objetivo específico: vender da melhor maneira possível a imagem da instituição à qual o profissional está atrelado. 

No caso da assessoria de imprensa, cabe como uma luva a máxima de Rubens Ricúpero: "Eu não tenho escrúpulos. Eu acho que é isso mesmo: o que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde". Se nessa máxima há algo que precisa ser corrigido, trata-se da primeira. Não há nenhuma falta de escrúpulo em adotar uma lógica factual, aquela que diz que não se deve lavar roupa suja em público.

É isso mesmo. Na assessoria de imprensa, o que é bom a gente fatura e o que é ruim a gente guarda para nós. Sempre com a responsabilidade de buscarmos uma saída para que essa, digamos, discrepância não permaneça escondida por muito tempo. Até porque não há nada que possa permanecer escondido por toda a vida. Um dia aflora. 

Querer misturar alhos com bugalhos deságua em confusão. Não se pode querer fazer jornalismo na assessoria de imprensa. O patrão te manda embora na primeira investida. A recíproca é verdadeira. Tratar o jornalismo como se fosse assessoria de imprensa é o atalho mais rápido para uma demissão de verde e amarelo.

Quando se consegue fazer assessoria de imprensa nas páginas de um veículo de imprensa, este perde-se no labirinto da irrelevância, deixando de servir à sociedade e passando a ser mais um folhetim de qualquer coisa, de uma ideologia ignota ou quereres outros que não o da sociedade à qual o veículo pretende servir. Vira piegas. Não dá!     
Interessante é que a gênese de ambos - assessoria de imprensa e jornalismo - está no curso de Comunicação Social. E, para completar a ambiguidade e salpicar mais discórdia nesse molho indigesto, não existe nem mesmo uma definição, tal como ocorre com a profissão de relações públicas: Comunicação Social com Habilitação em Relações Públicas.   

No caso dos irmãos gêmeos porém não univitelinos - jornalismo e assessoria de imprensa -, nem essa ressalva existe. Ambos são filhos do mesmo curso de Comunicação Social e, para complicar mais ainda, segue o tal do "com Habilitação em Jornalismo". Daí a confusão a nos cozinhar os miolos e dar um nó górdio nas nossas cabeças.

Eu prefiro dizer que quando ponho os pés no batente da instituição onde presto serviços como assessor de imprensa, deixo o jornalista que habita em mim do lado de fora. E não se tome aí por uma questão condenável de dupla personalidade, mas sim, de um caso de sabedoria que me leva a pôr cada coisa em seu lugar. Ignorar isso é mediocridade.

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