sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Verdadeira utopia

Por Francisco Espiridião

A produção em escala ininterrupta de arroz no interior da terra indígena Raposa Serra do Sol, território em vias de se tornar inacessível aos produtores, não é suficiente para oferecer ao boa-vistense um produto com preço mais acessível.

O preço alto deve ter como razão principal o fato de a produção local suprir também o vizinho Estado do Amazonas, diminuindo, assim, a oferta no mercado interno. Se em economia, porém, não existe mágica e o que impera é a matemática pura, o preço praticado internamente deveria ser menor que o de além divisa.

Mas, infelizmente, não é isso o que acontece. Nos supermercados de Manaus pode-se encontrar o quilo do arroz roraimense a um preço levemente inferior ao praticado em Boa Vista, o que sugere ginástica sobrenatural para explicar. Esse é um ponto. O outro, bem...

Aqui, o buraco é mais embaixo: se hoje consumimos um arroz tão caro, a questão que não quer calar é: como será, então, quando a produção se estancar de vez, em obediência à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) prestes a ser selada?

Aí alguém dirá: o Estado de Roraima não se resume à reserva Raposa Serra do Sol. Concordo. Haverá outras áreas disponíveis onde os produtores poderão dar seqüência à produção. Mas, convenhamos, a questão não é tão simples assim. Há muito mais em jogo.

Qualquer um sabe que o descompasso na produção será inevitável. A infra-estrutura montada hoje na extensão de 0,7% da reserva (região do Surumu) precisará ser retirada e instalada em outro local. Isso demandará tempo e recursos que, desconfio, a indenização da Funai não será suficiente para cobrir.

Por certo não haverá estoque de arroz suficiente para fazer face a todo o hiato na produção. Nesse particular, o fastio demandará açõ enérgica do Poder Público Estadual. Seria, quem sabe, o momento de se pensar em subsídios aos importadores.

Por fim, a palavra segregação não é uma das mais saudáveis. A decisão de excluir pessoas, em qualquer nível ou contexto, não é das mais elogiáveis num mundo já tão conturbado. Quando o sentimento de eugenia se acirrou, o mundo conheceu o holocausto judeu pelas mãos do nazista Hitler.

A separação de índios e não índios no interior da reserva Raposa Serra do Sol levará a uma situação insustentável, principalmente para os índios, que carecem de auxílio do governo estadual para continuar sua jornada de desenvolvimento.

Em locais onde os índios têm suas reservas blindadas para o convívio com os não-índios, o que se tem visto é que o Poder Público não tem capilaridade para dar a atenção necessária, seja na área da saúde, alimentação, educação etc. Índios mato-grossenses são exemplos disso.

A demarcação na forma como está é eivada de boas intenções, mas se mostrará desastrosa em futuro não muito remoto. Na prática, não vai dar certo, posto que firmada na máxima morusiana, ou seja, transformar o território de 1,7 mil hectares em uma ilha onde todos vivem em harmonia e trabalham em favor do bem comum. Pura utopia.

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