domingo, 8 de janeiro de 2017

A desnutrição e o desperdício

FRANCISCO ESPIRIDIÃO (*)
Rápida passagem pela Feira do Produtor, no bairro São Vicente, foi suficiente para eu começar a pensar num problema que aflige um bilhão de pessoas no mundo: a fome. Abacaxis inteiros, só porque apresentam aspectos de terem sido batidos durante o transporte, são descartados, jogados em contêineres de lixo, assim como tantas outras espécies de frutas aproveitáveis.

É algo brutal ver tanto desperdício de alimentos. Desolador ver tanta comida jogada no lixo, enquanto há tanta gente com ‘insegurança alimentar’, o pior eufemismo para fome. De acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), no mundo são aproximadamente 870 milhões de pessoas que sofrem de subnutrição.

Não estou falando de algo distante, como o leste e sul do Continente Africano, onde crianças sofrem de desnutrição aguda grave, definida como fome extrema. Imagens de crianças etíopes só coro e osso correm o mundo, suscitando pena nos mais variados segmentos sociais. A situação também é considerada de extrema gravidade na América Latina, especialmente na Bolívia, na Guatemala e no Haiti. Porém, nenhuma ação efetiva capaz de mitigar o problema.

Quando presenciei o exacerbado desperdício de comida na Feira do Produtor, veio-me à mente as índias venezuelanas fardadas a pedirem esmolas nos semáforos de Boa Vista. Pensei em quantas crianças que habitam o entorno da capital que sobrevivem com a barriga nas costas. Enquanto isso, centenas de quilos de alimentos vão aos tonéis de lixo. Frutas com um percentual acima de 80% de aproveitamento. 

Como eu sei disso? É claro que eu não estou nas casas das pessoas para conhecer tais detalhes, mas há um indicativo que não falha: o Cernutri, Centro de Recuperação Nutricional Infantil, da Prefeitura de Boa Vista. De janeiro a setembro deste ano, prestou 15.249 atendimentos, de acordo com matéria publicada na imprensa.

A unidade, localizada na avenida Ataíde Teive, Liberdade, oferece tratamento de reabilitação por meio do regime de semi-internação. Em outubro passado completou 26 anos prestando atendimento a crianças desnutridas da capital.

Parceria com o Sesi-RR permite ao Cernutri obter maiores conhecimentos sobre como manipular alimentos, bem como aproveitar todo o potencial que os diversos gêneros oferecem, antes de serem descartados. Por meio do curso Cozinha Brasil, os conhecimentos são repassados às mães que buscam no centro refúgio para o infortúnio dos filhos.

Amanhã se inicia um novo ano. Período em que a gente traça metas e metas. Promessas que não serão cumpridas, sabe-se. No momento do planejamento, que tal pensarmos nas criancinhas – sejam elas da África ou da periferia de Boa Vista – que não têm com que se alimentar?

Não sei como, mas cada um de nós é responsável. Pôr no prato só aquilo que vamos comer, sem desperdício, já seria um bom começo. Feliz e próspero Ano Novo! 

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