sábado, 29 de dezembro de 2007

Medo de bicho-papão

Francisco Espiridião

Escrevi dia desses numa crônica que gosto de trabalhar encolhidinho no meu canto. E é verdade. Com as mãos no teclado a coisa flui com maior facilidade. Nunca vi ninguém gaguejar escrevendo. Pelo menos o som de disco furado não ecoa.

Alias, minhas mãos são mais ágeis que minha mente. Sim. Infelizmente, tenho que reconhecer. Não chego a ser um “obturado”. Mas sou meio lerdinho para pensar. Funciono quase à base da lenha. Feito maria-fumaça lá da minha terra. Às vezes, elas não conseguem acompanhar o raciocínio. E quando isso acontece, sai cada asneira que por gosto se vê.

Tem gente que, ao contrário, gosta demais de falar. Esses são exímios e respeitabilíssimos políticos, apresentadores de TV, peritos locutores diante de um microfone de rádio, propagandista em frente de loja em época de Natal e de fim-de-ano. “Só paga um e leva três!”.

Ou cabeleireiros, feito a Eliana. Não há quem sente em sua poltrona, diante daquele quilométrico espelho, de parede a parede, para dar formas às melenas, que ali não solte o verbo. Todos experimentam momentos de descontração. Contando loas. É impressionante.

Até mesmo um conceituadíssimo juiz de direito na cidade, com doutorado em Oxford. Hoje ele anda meio sumido. Mas antes, costumava confiar-lhe a cabeleira. Embalado por uma conversava aprumada, como se ambos do mesmo nível intelectual fossem.

E olha que essa autoridade foi uma das pessoas mais difíceis que encontrei para entrevistar ao longo da carreira. Sempre na defensiva, respondia só aquilo que lhe era perguntado. E laconicamente: sim, não, han-han, hun-hun. Um saco!

Como disse, não sou muito chegado a falar. Expor-me na telinha, então, verdadeiro suplício.
Quando lancei “Até Quando – Estripulias de um governo equivocado”, choveram convites para aparecer num monte de programas. De rádio e de televisão. Recusei os que eram possíveis. De rádio não fui a nenhum. Aliás, estou em dívida com a amiga Consuelo Oliveira.

Mas em três de TV, não teve jeito. Fui. Meio que na marra. Dono do jornal matutino da TV Caburaí, na época, Wilson Barros chegou a pensar que eu estava a lhe esnobar. “Tá certo, você não vai a programa de pobre!”.

Só eu sei o quanto me custou atender a tão cordial pedido. Até de desarranjo da barriga fui acometido. Mas fui. No dele, no Sala de Imprensa, do saudoso amigo Humberto Silva, e no da amiga Marleide Silva, o Bom Dia Cidade! Da TV Ativa.

No do Humberto, até que não rolou tanto estresse. Era gravado à tarde e exibido no dia seguinte. Por volta do meio-dia. Almoçando com o Humberto Silva. Já no do Wilson e no da Marleide, o bicho pegou. Eram ao vivo. Sobrevivi. De preto, quase virei o Pavilhão Nacional. Às vezes verde, às vezes amarelo. De medo. Mas sobrevivi.

Não é por nada, não, mas quando você fala a pessoa que te escuta está com todas as antenas ligadas. Como receptor e decodificador ao mesmo tempo (preciso perder essa mania de ficar remoendo aulas da faculdade), o teu interlocutor está te julgando. De corpo presente. Ali, ao vivo e a cores.

É fácil entender. Extremamente tímido como só eu mesmo, tenho ojeriza a me expor. Daí, a preferência por escrever a falar. Nada contra quem gosta de falar. Acho até uma arte. Desprendimento à flor da pele.

Mas para mim, não dá. Bobagem, eu sei. Até o Francisco sabe que o microfone não esconde bicho-papão. Mas até aqui tem sido assim. Quem sabe um dia...

Ah, ia esquecendo. Silenciosamente, mas com verdadeiro ardor do coração, desejo a todos saúde, prosperidade e paz com Cristo nos próximos 365 dias.

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