Pesquisas
realizadas na USP, em São Carlos, mostram como a tecnologia pode tornar as
aulas de matemática mais atrativas
Entre
os trabalhos relacionados ao tema está um projeto de mestrado que utilizou o Robô NAO para
ensinar geometria a 62 adolescentes entre 13 e 14 anos de escolas públicas e
particulares de São Carlos. Por meio de um sistema de visão computacional, o
robô foi programado para reconhecer figuras geométricas planas. Com a ajuda de
professores da área de educação e de matemática, o pesquisador Adam Moreira
propôs diversas atividades aos alunos. Os estudantes foram desafiados, por
exemplo, a descobrir o nome de uma figura geométrica a partir de dicas
fornecidas pelo robô. No caso do retângulo, o professor robô dava as seguintes
pistas: “qual destas figuras geométricas na sua frente tem quatro lados? A
fórmula da área da figura que eu procuro é base vezes altura. A fórmula do
perímetro dessa figura é duas vezes a soma de sua base vezes a altura”.
Em
caso de acerto da resposta, o NAO abria os braços para o alto e piscava as
luzes LED de seus olhos em sinal de felicidade. Mas se o jovem errasse, o robô
abaixava a cabeça e ficava com os olhos vermelhos. Adam, que hoje é doutorando
do ICMC, explica que as reações do robô foram programadas com o objetivo de
torná-lo mais humano, o que facilita a criação de uma relação de empatia com os
jovens.
Em
outra atividade, os estudantes seguravam em suas mãos a imagem de um gato feito
com peças de tangram e deveriam adivinhar a quantidade de triângulos da figura.
O aluno digitava a resposta no teclado que estava ligado ao robô e, em caso de
erro, o NAO poderia dar até duas dicas, tais como “O triângulo é uma figura com
três lados, você consegue encontrá-los agora?” ou “As orelhas do gato são
formadas por triângulos.” Novamente, em caso de acerto, o NAO ficava feliz,
mas, se o aluno persistisse no erro, o humanoide se entristecia.
No final
das atividades, Adam aplicou um questionário sobre figuras geométricas aos
jovens e os estudantes que participaram das aulas com o NAO tiveram um
desempenho melhor (84.61% de acertos) em relação aos que não tiveram contato
com o robô (60% de acertos). “Os pesquisadores da área da educação estão
buscando novas ferramentas de ensino com a inserção de tecnologia em sala de
aula. Hoje em dia, nota-se que a simples exposição de conteúdo na lousa não
atrai toda a atenção dos alunos e a robótica pode tornar a aula mais atrativa”,
afirma Roseli Romero, professora do ICMC e orientadora do trabalho.
Roseli
conta que a robótica educacional é muito bem recebida pelos jovens e aceita por
todas as classes sociais. Os cenários em que essa área de pesquisa pode ser
aplicada são diversos: “Nós optamos por trabalhar conceitos matemáticos
utilizando os robôs, mas é possível programá-lo para ensinar física, geografia
ou português”. Segundo a docente, em breve, o Centro
de Robótica de São Carlos (CROB) oferecerá um curso de difusão sobre o tema para a preparação de
professores. Ela ressalta, ainda, que a inclusão do robô em sala de aula não
visa substituir o professor, e sim propor novas alternativas de trabalho.
Dupla
personalidade
Outra
pesquisa que se destaca é a de Daniel Tozadore, que também foi orientado por
Roseli. Ele programou o NAO para reconhecer figuras geométricas em 3D e receber
as respostas dos alunos por meio de voz. Os adolescentes escolhidos para participar
do trabalho tinham entre 10 e 14 anos e eram do Projeto Pequeno Cidadão, um programa pós-escola desenvolvido pela USP com aulas de
reforço, artes e atividades esportivas para estudantes da rede pública.
Daniel
dividiu os jovens em dois grupos a fim de comparar o comportamento e o
rendimento dos estudantes. Em uma das turmas, o pesquisador programou o robô
para ser mais simpático: “Quando as crianças chegavam, o NAO se levantava,
acenava com as mãos e, depois de cumprimentá-las, perguntava pelo nome da
criança. Ele também fazia movimentos como coçar a cabeça enquanto reconhecia a
figura geométrica e um “toca-aqui”, quando o aluno acertava a resposta. Em caso
de erro, o robô alterava o LED de seus olhos para vermelho e baixava a cabeça”.
Já com
a outra turma, o NAO era mais seco e pouco interagia com os jovens. Ele ficava
sentado em suas próprias pernas e dava apenas boas vindas aos alunos, sem
nenhum tipo de movimento, fazendo somente o reconhecimento das figuras. “Quando
comparados, os alunos que tiveram contato com o robô mais interativo se
sentiram mais motivados a estudar para as próximas sessões, além de
demonstrarem uma maior capacidade de concentração e assimilação do conteúdo”,
explica o atual doutorando do ICMC.
Para
classificar a interação dos grupos de estudantes com o robô, o pesquisador
aplicou o método Continuous Audience Response, que é utilizado na área de
marketing. A técnica permite, por exemplo, transformar em números as reações do
ser humano a algum estímulo. Todas as sessões de atividades com os alunos foram
gravadas e, posteriormente, cinco vídeos de cada turma passaram pela análise de
uma comissão de 11 estudantes das áreas de psicologia e matemática, que
atribuíram notas a essas dinâmicas.
“O
maior desafio da pesquisa foi sua interdisciplinaridade. Empregar os principais
métodos das áreas de pedagogia e tecnologia, que iniciaram sua fusão
recentemente, exige domínio e controle em ambas os campos. É essencial que
especialistas de cada área estejam sempre presentes”, conta Daniel. O
pesquisador revela, ainda, que todos os estudantes alegaram ser indispensável a
presença de um professor humano em sala de aula.
A
professora Roseli diz que o grande diferencial dos trabalhos de Adam e Daniel é
o uso de um robô humanoide: “Enquanto a maioria das pesquisas vem sendo
desenvolvidas com kits robóticos, eles utilizaram o NAO, que possui recursos muito
mais ricos, como a capacidade de fala, reconhecimento de imagens e de fazer
gestos, ou seja, a interação social é muito maior”.
Segundo
Adam, os experimentos apresentaram resultados promissores, mas são necessários
mais testes para se obter uma conclusão definitiva a respeito do uso do robô em
sala de aula. Em relação ao trabalho de Daniel, o pesquisador afirma que outras
técnicas para o reconhecimento mais rápido de voz devem ser testadas e
comparadas, além de novos parâmetros para classificação de imagens. A busca por
robôs financeiramente mais acessíveis também é um desafio. O doutorando
destaca, ainda, que estes projetos chamaram a atenção de alunos da graduação do
ICMC: “Hoje temos uma equipe com cerca de oito alunos de iniciação científica
bastante motivados, e queremos expandir esta pesquisa para alunos de outros
cursos relacionados, como a psicologia e pedagogia”.
Para o
futuro da robótica educacional, Roseli vislumbra uma grande revolução no
ensino. Ela acredita que, à medida que esses robôs forem se tornando cada vez
mais sociáveis e inteligentes, teremos grandes mudanças: “Hoje em dia, a
maioria dos professores prepara suas aulas utilizando computadores, então, por
que não pensar, no futuro, em prepará-las utilizando robôs?”.
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