domingo, 24 de outubro de 2010

O segundo aviso

Por FRANCISCO ESPIRIDIÃO


Teve um tempo em que era vedado o voto ao cabo e ao soldado. Mas isso já faz muito tempo. A partir da promulgação da Constituição de 1988, a coisa mudou de figura. É claro que a mudança não se deu de uma hora para a outra. Aconteceu aos poucos. Até 1996, nos intestinos da caserna não se tinha a verdadeira dimensão da novidade.

Mesmo com a letra viva saltando aos olhos, demorou a cair a ficha, especialmente nas esferas subordinadas. Parece que aqueles que tanto tempo viveram como cidadãos de segunda, posto não lhes ser dado o direito ao voto, não sabiam como se comportar diante do simbolismo autoritário que as estrelas cegas ou douradas lhes impingiam.

O artigo 5º da tal “Redentora” era lido por essa massa subalterna, mas interpretado meio que na encolha. Acesso à Justiça era “mosca branca”. Nos quartéis, plenamente difundida a máxima: “o soldado é superior ao tempo, porém, seus direitos, em uma folha de papel em branco”. A tal da “Mensagem a Garcia”, sabe? O superior mandou, não cabe ponderação. Cumpre-se!

Lembram do Mito da Caverna, de Platão? O procedimento dos subordinados era assim. Hoje, não! Cabos e soldados, tal como os que detêm as demais graduações e patentes, votam. Fazem até greve... Antes, o superior mandava: “Faça isso!” e a resposta não era outra senão “Sim, senhor!”. Hoje, depois de se quebrarem os grilhões que os prendiam ao gélido interior da caverna, é assim: “Faça isso!”. E a resposta: “Por quê?”.

Por muito tempo, o andar debaixo viu os oficiais fazendo uso da condição de superior em sua expressão maior. A ele, cabia apenas a tênue réstia de luz que escapava das fendas da ignorância.

Um dia a panela destampou. O típico "quem nunca tomou mel, no dia que toma se lambuza". Abusaram da regra três a ponto de tentar sabotar o serviço de escala em plena realização do primeiro turno das eleições.

As conseqüências terão de ser encaradas. É a lei natural. O que se planta colhe. Mas que é emblemático lá isso é. As portas permaneceram por muito tempo fechadas. Começam a ser arrombadas. Depois da greve do ano passado, esse parece ser o segundo aviso.

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